Jogos Vorazes – Em Chamas: produção acerta em segundo filme da franquia

Há tempos não me deparava com cinemas tão lotados em estreias de filmes. Despretensiosamente resolvi assistir a “Jogos Vorazes – Em Chamas” no dia em que entrou em cartaz, péssima ideia! As sessões estavam esgotadas no cinema mais próximo da minha casa. Até aí, tudo bem, respirei fundo e fui até o cinema mais distante, havia ingresso, mas nenhum lugar bom dentro da sala que se encontrava lotadíssima! Desde os tempos de Harry Potter que eu não via algo assim, parece que os órfãos do bruxo britânico migraram para os livros de Suzanne Collins. Mas apesar do desconforto da sessão, o segundo filme da quadrilogia (a adaptação do terceiro livro será dividido em duas partes, seguindo o novo ritual instituído pela saga do já citado bruxo) Jogos Vorazes, valeu a pena.

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Peeta Mellark (Josh Hutcherson), Effie Trinket (Elizabeth Banks) e Katniss Everdeen (Jennifer Lawrence)

“Em Chamas” trata da vida dos vencedores dos Jogos Vorazes do Distrito 12, Katniss Everdeen (Jennifer Lawrence) e Peeta Mellark (Josh Hutcherson), após chegarem em casa, e também das consequências do desfecho dos jogos, isto é, a sobrevivência de mais de uma pessoa, confrontando assim as regras impostas pela Capital. A vida dos tributos vencedores da 74ª edição dos jogos mudou, não necessariamente para melhor, agora eles têm de lidar com o peso  de ter confrontado o presidente Snow (Donald Sutherland). Seguindo as normas da competição, seguem em uma turnê de vitória visitando todos os doze distritos de Panem. Mas as coisas não saem exatamente como o planejado: Katniss, ao desafiar a Capital, deu esperança para que os demais também o fizessem. O sentimento de revolta de um povo adormecido começa a aflorar a cada visita a um novo distrito, enquanto Katniss se torna o símbolo de uma revolução, mesmo sem pretensão.

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Gale (Liam Hemsworth) sendo duramente reprimido pelos batedores do Distrito 12, que mais parecem os Stormtroopers de Star Wars

Percebendo a inquietação do povo e o símbolo que Katniss se tornou, o presidente Snow resolve acabar com seu tributo mais famoso, convocando uma nova edição dos Jogos Vorazes, só que dessa vez com vencedores de edições anteriores, incluindo os tributos do Distrito 12. Na colheita (momento em que os tributos são escolhidos para representar o seu Distrito na competição) não restava muitas opções: Haymitch (Woody Harrelson), Peeta e Katniss. Os competidores deste ano tinham algo maior do que simplesmente sobreviver aos jogos, algo que ia além da arena, algo além do que ser o último sobrevivente a chegar à cornucópia. É chegada a hora de lutar contra o sistema opressor, imposto pela Capital. Existe um símbolo, que carrega esperança e os distritos começam a se articular para combater a Capital. Presidente Snow aumenta a demanda de batedores (guardas que fiscalizam e combatem os desobedientes) nos distritos, como forma de punição. A título de curiosidade, os uniformes dos batedores muito se assemelham com os dos stormtroopers (tropa, formada por clones, de base do Império Galático da Saga Star Wars).

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Um dos organizadores dos Jogos, Plutarch Heavensbee (Philip Seymour Hoffman) e Haymitch (Woody Harrelson) mentor do Distrito 12

Por se tratar de uma continuação, é inevitável não haver retomadas. “Em Chamas” traz novamente a arena e os duelos do jogos, porém sem ser tão minucioso nas explicações, uma vez que subtende-se que o espectador já conheça as regras do jogo. Com o orçamento bem maior, 140 milhões de dólares, o segundo longa notavelmente teve uma produção mais caprichada, sem a cafonice que outrora foi retratada no primeiro longa. O veterano Francis Lawrence assina a direção desta vez, ocupando o lugar que na primeira vez foi de Gary Ross. Um destaque sobre o filme é que ele teria tudo pra se tornar um sci-fi juvenil com todos os requintes de exagero, mas foge completamente do óbvio e mantém-se sóbrio, centrando-se nos seus personagens principais. Aliás, quem tem Jennifer Lawrence, Donald Sutherland, Woody Harrelson e Philip Seymour Hoffman no elenco não precisa apelar pra pirotecnia. Lawrence venceu este ano o prêmio da Academia de melhor atriz, arrebanhando o seu primeiro Oscar, pelo desempenho em “O Lado Bom da Vida”. Independente de merecimentos ou não, Katniss Everdeen não poderia ter outra intérprete senão a atriz; Jennifer preenche a tela em todas as cenas em que aparece e cativa os espectadores (apesar de não ser intuito da sua personagem ser necessariamente cativante), sem soar piegas ou falsa.

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Katniss sendo introduzida ao público por Caesar Flickerman (Stanley Tucci) em seu vestido de noiva

Os desavisados que foram ao cinema a fim de diversão e não se deram ao trabalho de assistir a película anterior podem ter se frustrado, primeiro porque o filme, embora reavive algumas coisas, não tem o interesse de ser uma cópia do primeiro e nem tem na ação da arena seu tema central. “Em Chamas”, por se tratar de uma continuação do primeiro, tem seu início ligado ao filme anterior. Em se tratando de um elo entre o início e o desfecho da história, o final da sequência deixa os espectadores com um gostinho do que está por vir no grande final. Confesso que simpatizo pela série de livros, antes da produção chegar às telonas me deparei com a trilogia de Suzanne Collins e gostei da temática de um futuro distópico dos livros, embora seja um tanto frustrante que a maioria dos espectadores não compreenda ou mesmo não reflita sobre o subtexto de crítica social de que a obra trata e vejam o filme somente como uma representação do sistema de entretenimento de pão e circo.

Panem vive em um constante estado de sítio, a desigualdade social é fruto de um governo totalitário e opressor, comandado pelo presidente Snow na Capital. Os distritos sobrevivem para oferecer o que têm de mais abundante e proveitoso de suas terras aos bem nascidos que moram na Capital. A ideia de um Estado controlador que aliena não é tão distante da nossa realidade. A escritora Suzanne Collins não precisou ir muito longe para se inspirar, afinal, ela nasceu no maior império deste século, os EUA, onde guerras são necessárias para se impor, manter seu status de supremacia perante as outras nações, além de constantemente vigiar os demais países, assegurando que nada fuja ao seu controle. Fazendo referência a uma população cada vez mais alienada e fútil, que se acostumou a consumir sem refletir e produzir sem entender seus motivos, “Jogos Vorazes” é uma literatura infanto juvenil que deve ser lida indo além dos conflitos sentimentais de sua protagonista.

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Novamente na arena, Katniss dessa vez luta contra um novo inimigo

Não sei se os órfãos de Harry Potter migraram para a franquia Jogos Vorazes, mas tendo em vista outras sagas e filmes com temática infanto juvenil, acredito que a obra de Suzanne Collins ainda seja uma das melhores opções. Com um elenco comprometido e ótimas atuações, uma produção (desta vez) digna, e uma história interessante, “Jogos Vorazes – Em Chamas” me surpreendeu, foi fiel ao livro e não perdeu o tom em nenhum momento.

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Leila de Melo
Uma míope quase sempre muito atrasada, cinéfila por opção, musicista fracassada e cronista das pequenas idiotices da vida. Pra sustentar suas divagações é jornalista, roteirista e fotógrafa.
Leila de Melo

Leila de Melo

Uma míope quase sempre muito atrasada, cinéfila por opção, musicista fracassada e cronista das pequenas idiotices da vida. Pra sustentar suas divagações é jornalista, roteirista e fotógrafa.

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Matheus Geres
Admin
10 anos atrás

Massa! Quero ler primeiro todos os livros para depois poder assistir com uma visão melhor. Assim cheguei a conclusão que Percy Jackson e o Ladrão de Raios foi um grande fiasco.

trackback
10 anos atrás

[…] E agora? Precisa dizer mais? Quem não viu, ainda pode correr pra ver! O filme vai ficar em cartaz por um bom tempo ainda. Mas antes, aproveita e lê a nossa crítica sobre Jogos Vorazes: Em Chamas. […]

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