“Se acaso me quiseres sou dessas mulheres que só dizem sim…” esse trecho da canção Folhetim de Chico Buarque poderia definir a personagem Therese Belivet de “Carol”. Na adaptação, indicada para seis Oscars, do romance escrito por Patricia Highsmith em 1952, e dirigido por Todd Haynes (I’m not there, Longe do Paraíso e Mildred Pierce), esse traço fica ainda mais acentuado pois aqui a personagem perde o papel de narradora da história presente no livro. Sem esse papel, Therese acaba passando uma imagem mais “passiva” pois sabemos muito pouco a respeito dos seus conflitos internos, invertendo também o seu papel de principal na trama.
E nisso a atuação de Rooney Mara (Millenium: Os homens que não amavam as mulheres) cai como uma luva, apresentar a timidez, inexperiência e a curiosidade de Therese, mas optando por acrescentar um toque de candura que falta à personagem do livro, que pode ser adjetivada como pessimista, entediada e um tanto rude no trato com o “namorado-não-desejado” Richard.
A carreira de cenógrafa iniciante de Therese também não é citada no filme, que começa a película trabalhando na megastore Frankenberg, ela é apenas citada como uma interessada em trabalhar com fotografia, mas só de paisagens. “Deveria estar mais interessada em pessoas”, diz ela a Carol em uma passagem.
Carol Aird (Cate Blanchett) agora não é apenas apresentada pela ótica da outra personagem, a escolha pela ausência de narrador traz a personagem para os holofotes, como principal, marcante. A escolha por Blanchett também foi afinadíssima, daí a indicação como melhor atriz para o Oscar, ela meio que empresta algumas de suas características à personagem.
Carol é rica, elegante, está se divorciando nos anos 50 e tem uma filha pequena cujo presente de Natal a faz ir até a loja onde Therese trabalha. O envolvimento começa com os olhares e vai evoluindo aos poucos com Therese se deixando levar. Para quem leu o livro (e é chato), a narração faz falta apenas nos momentos dos olhares, a fim de nos situarmos sobre o que a personagem está sentindo.
O fato inédito para mim é o abandono do estereótipo de todo filme com temática que envolve duas mulheres: o exagero no melodrama. Os problemas que as duas enfrentam são mais devido à época em que se passa a narrativa do que tragédias, envolvimentos bissexuais, psicopatia, traições, doenças, ou em resumo a visão de punição das protagonistas.
O recorrente arquétipo da mulher mais masculinizada que encontra sua feminina também não aparece aqui, diferente até de sucessos como Azul é a cor mais quente (2013). A homofobia e invisibilidade lésbica são os maiores inimigos que as duas enfrentam na década de 50, não diferente da vida real nos anos 2010. O filme é sobretudo sobre como o amor é uma aposta das mais necessárias e arriscadas da nossa vida.
Entre os prêmios do filme já está uma palma de ouro de melhor atriz recebida por Rooney Mara. Já no Oscar, além de melhor atriz para Cate Blanchett e melhor atriz coadjuvante para Rooney Mara, o filme também foi indicado para os prêmios de melhor fotografia (Edward Lachman), melhor roteiro adaptado (Phyllis Nagy), melhor trilha sonora original (Carter Burwell) e melhor figurino (Sandy Powell).
Carol também recebeu 9 indicações para o Bafta que incluem melhor filme, melhor fotografia, melhor design,melhor roteiro, melhor direção, melhor figurino e melhor maquiagem. E ainda 5 indicações ao Globo de Ouro de melhor trilha sonora, melhor filme dramático, melhor diretor e melhor atriz em filme dramático.
A fotografia de Carol é algo que deve ser apreciado nas grandes telas pois foi gravado em uma câmera Super 16mm para adicionar o efeito estético da época. Infelizmente o meu primeiro contato com o filme foi assistindo numa qualidade bastante pixelizada no YouTube. Mas como para tudo tem remédio, o filme estreou em solos natalenses nessa quinta-feira no Cinépolis Natal Shopping em dois horários, às 14h (durante a semana) e às 19h30 (sábado e domingo). Agora é só correr pra assistir.
Veja o trailer:
Dotada de um humor estranho e viciada na busca por música nova. Ama HQ, gibi e as demais coisas que envolvem literatura e arte. Formada em Jornalismo e Rádio & TV na UFRN. E cursando Letras na UFPI.