Primordium: bate papo sobre metal, cultura egípcia e cena underground

Restando poucas horas antes de se iniciar a décima primeira edição do Festival Dosol, O CHAPLIN conversou com uma das bandas potiguares que têm se destacado em seu nicho cultural e chega ao festival para fechar o ano de 2014 com chave de ouro. A banda em questão é a Primordium, que adentra no evento às 17h15 deste domingo (09) com seu death metal inspirado no Egito antigo, vociferando sua pegada insana e ensurdecedora que foi registrada no seu já aclamado debute full length, o qual fora batizado de “Todtenbuch”.

Com mais de uma década de atividade, aproveitamos para conversar com o Primordium a respeito da cena cultural em que está inserida, os “primórdios” da banda, as inspirações e as aspirações, entre outros assuntos.

primordium

O CHAPLIN: Como nasceu o Primordium?

PRIMORDIUM (Representado por Gerson Lima – vocalista): O Primordium, como outras 99% das bandas existentes na cena underground, nasceu da união e do desejo de alguns amigos de tocarem metal. Tudo começou em uma “birita” na minha casa. No começo queríamos ter uma banda estúdio para tocar covers de bandas clássicas para nós (Paradise Lost, Hypocrisy, Rotting Christ, Tiamat, Entombed, Therion…). Com o passar do tempo à brincadeira foi se tornado sério então começou a tomar a postura de uma banda que traçava planos para compor músicas próprias e, por seguinte gravar uma demo-ensaio, uma demo-tape e chegar aos palcos. O embrião do Primordium foi a banda Epitaphium que era formada por mim (Gerson Lima), Belial (ex-Lord Blasphemate e atual Shedim), Sérgio (ex-Nightbreath, ex-Shedim e atual Deluge Master), Sidney Campos (ex- My Fallen Garden) e Marcio Vinicius (ex-Nightbreath e Renegades).

O CHAPLIN: Quais as principais influências culturais do grupo?

PRIMORDIUM (G.L.): Desde o começo do processo da elaboração das primeiras letras autorais o foco foi temas ligados à história antiga, ou contos de terror. A primeira letra autoral foi “Bathorys Throne” do demo-ensaio “The Grand Elevation Of Pagan Temple” (2001), canção baseada na condessa Elizabeth Bathory. A temática egípcia começou a ser explorada na demo-tape “The Sacred Valley Of The Kings” (2002). Posso citar que temos como principais influências filmes clássicos de terror, o estudo de civilizações antigas e temas ligados ao esoterismo.

 O CHAPLIN: Quais são as inspirações para as letras e músicas?

PRIMORDIUM (G.L.): Particularmente todos nós curtimos o estudo de civilizações antigas e a prática que influenciou no legado cultural de cada uma delas para o enriquecimento das mais diversas sociedades. 80% dos músicos do Primordium tem formação acadêmica na área humanística, fazendo com que nosso foco de pesquisa e estudo sejam voltados para trabalhos ligados a vivência humana.

O CHAPLIN: Qual o show, realizado pelo Primordium, que o grupo considera como o mais importante até hoje?

PRIMORDIUM (G.L.): Cada show tem sua história. Honestamente falando, considero todos importantes, pois cada um fez parte de um momento, formação, público ou cidade que estávamos visitando. Estamos tocando ao vivo tem 13 anos. A cada apresentação da banda aprendemos um pouco mais, e curtimos a intensidade da interação com os amigos que saem de suas casas para nos apoiar. Esperamos poder levar nossa mensagem por muitos anos, e que cada show tenha sua marca. Afinal, “depois que se mergulha no rio, ele nunca é o mesmo” (risos).

PRIMORDIUMO CHAPLIN: Como o grupo analisa a cena underground em que está inserido?

PRIMORDIUM (G.L.): Temos consonância em nossa forma de pensar devido a estarmos há um bom tempo imersos dentro da cena underground local. Eu conheço o Augusto Caesar e Alex Duarte – baterista e guitarrista, respectivamente – há quase duas décadas, e sempre frequentamos os mesmos eventos na cidade. Já o João (baixista), e o Lux (guitarrista), temos quase quinze anos de experiência com bandas. Nós cinco já produzimos shows, tivemos outras bandas, distro e alguns já foram até produtores de bandas locais. Acredito que a cena underground ainda convive com o estigma do sofrimento em virtude da mentalidade de alguns que acreditam que ser underground é sinônimo de produções de baixo custo e precariedade estrutural.  Na minha visão, o underground é uma contra cultura que se opõe ao movimento mainstream, e não significa ser franciscano ou viver de caridade. Todas as bandas para sobreviverem têm custos significativos. Na medida em que você profissionaliza seu trabalho, agrega valor ao seu portfólio, tornando-0 mais rico, e para manter um padrão de qualidade é necessário valorizar o seu trabalho. Temos consciência que nunca viveremos da música, porém acreditamos que poderemos reduzir custos através do lançamento de novos materiais lançados e a ajuda de custo dos shows que realizamos. Ter uma banda; abrir uma distro, loja ou selo; ser promoter de eventos é o mesmo que administrar uma empresa. É inadmissível exigir qualidade de um evento em que os preços mal dão para pagar os custos. Há vinte anos eu fui a um show do Dorsal Atlântica em que o ingresso custava R$ 8,00. Na época uma cerveja de 600ml custava R$ 0,50 centavos. A mesma cerveja custa hoje R$ 5,00. Existem shows atualmente que custam R$ 10,00. O mais curioso que vejo gente reclamar dos preços dos ingressos que estão congelados tem quase duas décadas, porém os mesmo reclamões pagam R$ 500,00 por uma jaqueta de couro para andar em uma cidade tropical. Ser headbanger não é apenas se “travestir” de preto e pagar de “fudidão”. Devemos zelar antes de tudo pela manutenção das bandas, zines, lojas, distros e shows.

O CHAPLIN: O vinil é uma forma de lançamento que sempre esteve presente no underground, mesmo com ascensão e declínio do CD e a era dos arquivos digitais. Diante disto, o Primordium não pensa em lançar algo em vinil?

PRIMORDIUM (G.L.): Até queríamos lançar o álbum “Todtenbuch” em vinil. Imagina aquela arte do álbum em um vinil? Seria bem bacana contemplar o trabalho do Sandro Freitas – artista local responsável pela arte do disco citado – em uma versão mais ampliada. Sem contar que o áudio foi muito bem produzido pelo João e o Lux. Infelizmente na era dos arquivos digitais, e na cabeça dos “cyberbangers”, parafraseando meu irmão Kall do Nocturne Sortilege, tudo tem que ser quase de graça. Muitos hoje não valorizam o trabalho físico das bandas, optam por baixar a custo zero. Nenhuma gravadora se arrisca em empregar dinheiro e algo que demore a dar retorno.

O CHAPLIN: Dentre os quatro lançamentos do Primordium, ao longo destes mais de dez anos de estrada, qual o grupo considera primordial para a consolidação da banda?

PRIMORDIUM (G.L.): Acredito que cada lançamento tem a sua importância dentro e um contexto de trabalho. Cada banda tem uma forma de trabalhar seus lançamentos durante um dado espaço de tempo. Hoje trabalhamos em uma perspectiva de projeto cíclico, ou seja, fazemos um planejamento (curto, médio e longo prazo) dentro de cada lançamento. A cada novo trabalho lançado existe uma validade visto que a cena underground é super dinâmica e repleta de bandas que estão trabalhando profissionalmente (alguns até com assessoria de impressa). Em 2001, graça ao demo-ensaio, tivemos a oportunidade de fazer nosso primeiro show ao vivo em Natal, além de viajar para cidades vizinhas. Já em 2002, como lançamento da demo-tape, tornamos o Primordium uma banda reconhecida na cena underground nordestina e nacional, porém éramos até então mais uma banda aspirante. Devido ao longo tempo sem lançar algo, o ep lançado em 2011 mostrou que estávamos ativos e preparando um novo trabalho. Agora em 2014, o álbum “Todtenbuch” foi a consolidação e a materialidade de que estamos vivos, fortes, atuantes e bem mais maduros frente aos lançamentos anteriores.

O CHAPLIN: Como as gravações anteriores do Primordium contribuíram com a produção do Todtenbuch?

PRIMORDIUM (G.L.): Contribuiu à medida que nós acreditamos que sempre estamos em processo evolutivo. Todas as gravações anteriores nos servem, além de parâmetro, como acúmulos de experiências para mantermos sempre em evolução sonora e temática.

O CHAPLIN: Quais as perspectivas da banda com o lançamento do Todtenbuch?

PRIMORDIUM (G.L.): Esperamos conquistar e fincar nossa bandeira nos mais altos cumes do underground nacional.

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Bruno Oliveira
Agitador cultural, headbanger, colecionador de vinis, leitor de hq’s e um dos produtores do único bloco de Rock’n’Roll do carnaval de Pirangi, Atrasados Para Woodstock.
Bruno Oliveira

Bruno Oliveira

Agitador cultural, headbanger, colecionador de vinis, leitor de hq's e um dos produtores do único bloco de Rock'n'Roll do carnaval de Pirangi, Atrasados Para Woodstock.

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