O ex-agente antiterrorista Jack Bauer é um herói da TV estadunidense. Isso se deve, além da excelente produção, à sua capacidade de diálogo com o trauma do 11 de setembro de 2001. Em meio a tanta dor, 24 Horas surgiu com um protagonista forte, tridimensional e repleto de patriotismo, responsável por defender o país de cruéis terroristas. Assim, a série se firmou como uma das mais importantes produções televisivas dos Estados Unidos ganhando prêmios e fãs por todo o mundo.
Com seu formato em tempo real, onde cada episódio é uma hora no dia de Bauer, o programa contabilizou 8 temporadas e um filme para TV, atingindo seu ápice com as 3ª, 4ª e 5ª temporadas. Não sei bem ao certo se, entre o 11 de setembro e a morte de Bin Laden em 2011, a população dos E.U.A. foi perdendo o interesse no assunto “terrorismo”, o fato é que a audiência de 24 Horas começou a cair nos anos seguintes, muito pela excessiva repetição de sua estrutura narrativa.
A melhor alternativa foi finalizar a atração e dar ao ex-agente um final digno. Nisso, a produção criada por Joel Surnow e Robert Cochran (respectivamente criador e roteirista de La Femme Nikita) foi muito feliz ao resgatar, na metade final de seu derradeiro ano, toda a excelência que caracterizou o programa.
Passados quatro anos, a Fox decide tirar Bauer de seu hiato definitivo para suprir a ausência de uma atração principal em sua grade de programação. Sob o título Viva um Novo Dia (Live Another Day), 24 Horas volta para a alegria de seus fãs. Na trama, o presidente James Heller (William Devane de Batman: O Cavaleiro das Trevas Ressurge), acompanhado de sua filha Audrey Boudreau (Kim Raver de Grey’s Anatomy) e de seu Chefe de Gabinete e genro Mark Boudreau (Tate Donovan de Argo), está em Londres para fechar um acordo envolvendo o uso de drones pelas forças armadas britânicas. Nesse mesmo dia, a CIA descobre que Bauer (Kiefer Sutherland de Pompeia) também está na cidade e se adianta em aprisionar o ex-agente sob a suspeita de atentar contra a vida do presidente.
A promessa de novidade ficou para o novo formato da série. Para esse novo ano, 24 Horas trouxe apenas 12 episódios, metade da quantidade original, o que deixou a trama mais enxuta, direta e com um ritmo alucinante. Porém, o show caiu no erro de reprisar a mesma formula dos anos anteriores.
Conspiração, traições, agentes duplos, artimanhas políticas, descrença em Bauer e esforços inacreditáveis para resolver a situação. Tudo isso é um grande presente para o fã. É muito bom rever Jack em ação novamente, mas ressurgir com um programa já terminado sem trazer novidades é uma falha.
Os roteiristas mais uma vez apresentam uma trama retirada das manchetes de jornais, uma acertada característica da série. Agora, o foco é a utilização de drones pelas forças armadas. O show propõe uma avaliação até crítica de como isso pode ser prejudicial pruma nação. Apesar de ouvirmos da boca do presidente Heller que essa tecnologia é útil, a produção cria uma situação contrária ao dar aos terroristas um artefato que permite invadir o sistema de segurança dos EUA, controlar os drones e usá-los em atentados contra Londres só para ridicularizar o país da América do Norte. A ideia é mostrar que, por mais seguro que seja o sistema, ele está passível de ser violado.
Outra característica da série é o bom elenco. Devane retorna à série como Heller. O ex-secretário de defesa agora é presidente e sofre com Alzheimer. Além dele, temos a grata surpresa de ver Audrey novamente e bem de saúde. Outra presença importante é a de Chloe O’Brian (Mary Lynn Rajskub de Julie & Julia). Chloe vem pra essa temporada com um drama pessoal interessante, reflexo de seus atos no passado para ajudar seu melhor amigo Jack. Porém, a atração erra ao vestir a analista de sistemas com roupas e maquiagens muito parecidas com as de Lisbeth Salander, personagem de Rooney Mara em Millennium: Os Homens que Não Amavam as Mulheres. O visual foi uma referência exagerada e não combinou com o perfil da personagem. Ainda participam da série Yvonne Strahovski (Chuck), como a ótima agente da CIA Kate Morgan e a excelente Michelle Fairley (Game of Thrones) como interessante Margot Al-Harazi.
Trazendo a força habitual em sua interpretação, Kiefer Sutherland sabe mostrar como Bauer é foda! Mesmo com o visível peso de seus quase 50 anos, Sutherland mostra estar em forma para as ótimas sequências de ação e continua efetivo nas cenas dramáticas. Destaque para o seu reencontro com Audrey. O ator pode ser considerado meio canastrão e é dono de uns tiques estranhos, como balançar a cabeça para os lados quando está ao telefone, mas tudo isso funciona porque ele é um ator competente. Nessa temporada ainda vemos Bauer com um temperamento mais agressivo que o da anterior. Como se estivesse ligado no modo “foda-se”, o herói de métodos questionáveis luta para proteger o presidente e a população londrina, mas não abre mão de fazer justiça com as próprias mãos. Um reflexo de tudo o que já sofreu e perdeu.
Analisando todo o trabalho no decorrer dos episódios, 24 Horas: Viva um Novo Dia entrega muita qualidade. Um ritmo frenético, sem enrolações e com boas reviravoltas. Algumas coisas bem forçadas e outras que já cansamos de ver. Decepção só no último episódio que, mesmo sendo bom, contou com um acontecimento muito desnecessário no meio e um final frustrante. A escolha pelo desfecho aberto foi um pecado já que não se tem confirmação de uma nova temporada. E devido à baixa audiência, ela não deverá sair. Assim, somos obrigados a ignorar o final apoteótico do 8º ano para lembrar de um que apenas SUGERE o que PODE acontecer com Bauer. Um desfecho meia boca que não faz jus ao protagonista e desrespeita os fãs. Ao menos me senti homenageado ao rever personagens tão queridos.
Radialista por formação e jornalista em formação. Minha paixão pelo cinema me trouxe ao Chaplin; minha loucura, ao Movietrolla. Qualquer coisa, a culpa é d’O Chaplin… E “A Origem” é o maior filme de todos!