Não existe um diretor americano da geração que surgiu em meados dos anos 90 que se iguale a Paul Thomas Anderson quando o assunto é oferecer um panorama psicologicamente sincero – e por isso mesmo assustador – de determinados arquétipos estadunidenses; desde alegorias sobre a ocasionalidade e a estafa presente nas relações cada vez mais impessoais do mundo de hoje (Magnólia), passando pela sutileza psicótica de Daniel Plaivew em “Sangue Negro” , uma obra imageticamente construída por belas metáforas visuais, substancialmente relativas aos fatores nos quais está encimada a sociedade americana: a obsessão pelo trabalho, a competitividade, a ambição e a cobiça.
Cinco anos depois, P.T. Anderson retorna com seu novo rebento, “O Mestre”, estrelado por Phillip Seymour Hoffman e Joaquim Phoenix; este último interpretando Fred, um marinheiro que deixa a Segunda Guerra Mundial traumatizado, com crises de ansiedade e incapaz de controlar seus impulsos sexuais, que são geralmente abrandados (ou instigados) por coquetéis a base de solvente para motor. Ocasionalmente, em um de seus porres, Fred conhece Lancaster Dodd, líder de uma organização religiosa denominada de “A Causa” – uma clara alusão à Cientologia, seita criada pelo escritor de ficção científica L. Ron Hubbard.
Lancaster, toma Fred como seu pupilo e cobaia para as suas “terapias” psico-espirituais, e aos poucos, é tecido um manto de interdependência na relação mestre/aprendiz. Dodd enxerga seu aprendiz como um quebra cabeças a ser montado, um sujeito que se curado de sua impulsividade e conduta errante, atestará a eficacia da seita, e satisfará a expectativa do Mestre no que tange os seus próprios métodos.
No decorrer da trama, percebemos como a autonomia da consciência individual de Fred vai sendo minada por discursos embasados em verdades pseudo-científicas e espirituais. Nunca fica claro na trama a real essência da doutrina alardeada pela seita comandada por Dodd; ao invés disso, o foco narrativo se adensa na convivência dos dois personagens principais, e paralelamente vemos um estudo sobre a ressonância psicológica que uma relação de dependência de cunho pessoal pode gerar, afinal, em qualquer seita ou organização, é imprescindível haver o vetor que suscite a empatia(adoração) do fiel em relação ao seu líder.
Nesses tempos de estapafúrdias religiosas e patuscadas fundamentalistas, é urgente que, pelo menos, selecionemos um tempo para a análise e reflexão do conteúdo abordado em “O Mestre”, algo que se estenda além dos términos dos créditos finais, e que nos alerte sobre o perigo do falso reconforto proporcionado por tantas doutrinas espirituais.
Abandonou a escola logo cedo porque não conseguia aprender nada. Cursou História na UFRN, para mais uma vez descobrir que as instituições de ensino são “gulags” que destroem todo e qualquer sentido genuíno de saber. Hoje, exilado em Campina Grande-PB, dedica-se ao anarquismo espiritual.