Monstros alienígenas submarinos, robôs projetados para proteção humana, cenas de ação, lutas decisivas para a vida no planeta Terra. A princípio, a ideia simplista de “Círculo de Fogo” pode soar como algo familiar, tipo aquele filme de sessão da tarde que você assistiu em sua infância ou mesmo algum seriado japonês matinal. No entanto, a nova produção dos estúdios Warner contou com o mexicano Guillermo Del Toro, um diretor criativo que soube bem usar dos elementos “clichês” e fazer um dos melhores filmes que vi esse ano.
Para combater os Kaijus, foram criados os super robôs (comandados por dois pilotos) chamados Jeagers |
Del Toro pode não ser “o cara”, talvez não figure na lista dos dez melhores cineastas da atualidade, mas sem dúvida é um dos diretores mais criativos e passionais do eixo hollywoodiano. Quando lhe dão a oportunidade de criar um mundo seu e desenvolver seu lado lúdico e fantasioso, ele é capaz de nos brindar com filmes extremamente divertidos e com propostas estéticas e visuais que agradam, como o caso da franquia Hellboy, ou ainda no gênero suspense e terror com “O Labirinto do Fauno” (2006), “A Espinha do Diabo” (2001) e o mais recente “Mama” (2013).
“Círculo de Fogo” poderia ser só mais um filme de ação, com robôs e monstros, no entanto, ao contrário de outros filmes do gênero, a diversão vem em um pacote completo, com um elenco sem grandes nomes, porém de muita dedicação e carisma; bastante técnica, com efeitos visuais que valem a pena o 3D, embora sem excesso, sem perder o foco do enredo; um diretor que além de competente é um nerd de carteirinha que soube brincar com várias referências, sem perder o respeito ou mesmo cair no ridículo e, por fim, uma diminuta problemática de continuidade nas cenas, sim porque se tratando de filmes de ação é quase que inevitável que algumas falhas nesse sentido existam.
Após várias vitórias dos Jaeger frente aos monstros, os Kaijus voltaram mais fortes que antes |
Em um futuro não muito distante do que vivemos, homens passam a ser ameaçados por gigantescas criaturas que saem das profundezas da terra. Sim, se você pensou em Godzilla, a referência está correta; essas terríveis criaturas são denominadas de Kaiju, provenientes de uma fenda multidimensional entre placas tectônicas localizada no fundo do Oceano Pacífico, mais precisamente no chamado “círculo de fogo”, área onde há um grande número de terremotos e uma forte atividade vulcânica, localizado no Norte do Oceano Pacífico.
Para combater as imensas criaturas, as potências de todo planeta unem forças para elaboração de uma força tarefa de extermínio aos Kaijus, criando assim robôs imensos, denominados Jaegers, que são controlados por duas pessoas através de uma conexão neural. Dentre os vários pilotos da trama, um dos poucos que após um ataque brutal dos alienígenas conseguiu controlar um robô sozinho foi Raleigh Becket (Charlie Hunnam), personagem principal da história. Apesar dos esforços, depois de um tempo, os grandes robôs são insuficientes para a destruição dos seres.
Com ataques contínuos, as forças armadas mundiais investem em uma frente de combate no epicentro do Kaijus |
Com a perda do irmão em um ataque dos Kaijus, Raleigh sai da divisão dos Jaegers e segue sua vida. Porém, o oficial Stacker Pentecost (Idris Elba) a frente da divisão dos robôs tem poucos meses para provar a seus superiores que é possível vencer as criaturas com seu pelotão principal de pilotos, para isso ele recruta os melhores controladores, incluindo Raleigh Becket. Um novo ataque está programado para atingir a costa chinesa, pesquisadores como o Dr. Newton Geiszler (Charlie Day) e Dr. Hermann Gottlieb (Burn Gorman), dois cientistas pouco ortodoxos que fazem parte do núcleo cômico do longa são convocados para colaborar com os estudos sobre as criaturas. No entanto, o maior problema é conseguir um parceiro para Raileigh, uma vez que é preciso ter uma sincronia neural entre os dois pilotos do Jaeger. Eis então que Mako Mori (Rinko Kikuchi), meio a contra gosto do oficial Pentecost, se candidata. A conexão entre os dois é classificada como altíssima e assim ambos estão aptos para pilotar e é dada a largada da caça aos seres alienígenas.
O mais legal de Círculo de Fogo é a criatividade do diretor. Estava pensando eu cá com meus botões, se esse roteiro, divertidíssimo de Travis Beacham e Guillermo del Toro caísse nas mãos de um outro diretor de ação de filmes similares, como um Michael Bay (Transformers) da vida, certamente a história teria sido cortada pela metade, alguma bomba ou jato teria sido lançado e tudo teria sido comemorado com bandeiras norte-americanas flamejantes, mas para sorte geral da produção e dos admiradores do bom cinema, não foi isso que aconteceu.
Raileigh (Charlie Hunnam) e Mako Mori (Rinko Kikuchi) lado a lado em seu Jaeger |
Os super robôs, Jaegers são referências aos Tokusatsu, filmes de efeitos especiais japoneses, gênero que englobava praticamente qualquer produção cinematográfica ou televisiva que se utilizasse de efeitos especiais, dentre eles os clássicos heróis de séries e filmes japoneses, como: os seriados Kamen Rider Black, Jaspion, Jiraiya, Ultraman, Flashman, Winspector e Spectreman, só pra citar alguns. Outra memória que me ocorre também é o famigerado Megazord da série de TV Power Rangers. Kaiju na cultura japonesa é o “animal incomum”, mas que costuma ser traduzida como monstro, é o vilão do gênero tokusatsu.
O filme conta com com um elenco de série, por assim dizer, uma vez que Charlie Hunnam é o protagonista de “Sons Of Anarchy”, Idris Elba é o detetive que dá nome a série “Luther”, Charlie Day é o incomum detetive de “Psych”, e Ron Perlman (em uma pequena participação) é também membro da gangue dos motoqueiros da série “Sons Of Anarchy”. Também não tem grandes estrelas da telona, porém é dotado de entrega e um entusiasmo que vem desde o roteiro até os sets de filmagem ao lado de Del Toro. Outro destaque para a película é Rinko Kikuchi, a atriz japonesa já tinha me chamado atenção em sua participação no filme Babel (2006) e neste longa, ela novamente se sai muitíssimo bem.
Oficial Pentecost (Idris Elba) ao lado do piloto Raileigh |
Del Toro mostra que é possível fazer um filme divertido, sem subestimar o cérebro dos espectadores, ter um elenco sóbrio e sem soberba, para contar uma história com todos os elementos que um bom filme de ação deve ter, sem exagerar em nada. Para os fãs de cultura japa, será um deleite, para os não fãs de cultura japa, não se deixem cair no preconceito óbvio, “Círculo de Fogo” vale o ingresso 2D, 3D e mesmo repetir a sessão, até agora o melhor filme do gênero ação que vi no ano e um dos melhores filmes de 2013.
Uma míope quase sempre muito atrasada, cinéfila por opção, musicista fracassada e cronista das pequenas idiotices da vida. Pra sustentar suas divagações é jornalista, roteirista e fotógrafa.
[…] Como muito já se falou de aspectos positivos como a fotografia formidável, a trilha sonora impactante e os efeitos especiais eficientes, principalmente no que concerne aos macacos, maravilhosamente interpretados por atores reais, focarei em aspectos do roteiro que me chamaram atenção e me fizeram achar de Planeta dos Macacos: O Confronto um dos blockbusters mais inteligentes do ano, assumindo o lugar que ano passado, em minha lista, pertenceu a Círculo de Fogo. […]