Quando se fala em música pop, você, caro leitor, deve imaginar um punhado de cantoras industrializadas que pouco variam em timbre e vestimenta e findam sendo mais do mesmo, fato! Eu gosto de pensar no universo da música pop além dos cinco ou seis nomes mais famosos e ir fuçar gente com trabalho autoral de qualidade. Bem, nessas de caçar e procurar álbum, me deparei com o álbum “Days Are Gone” (2013) das irmãs Alana, Este e Daniele Haim, que é um grande apanhado de referências com um quê de originalidade, talento e personalidade. O disco de estreia do trio de Los Angeles figurou nas principais listas de Melhores Álbuns de 2013 e só agora eu entendi o motivo.

Com a liberdade de revisitar outras décadas proporcionada pela internet, os anos 2000 viram um boom de releituras, recriações e reapropriações da sonoridade oitentista, entre outras releituras. Os infames sintetizadores que geraram as canções mais bregas e cafonas décadas atrás, ganharam forma e vez ao lado de novos arranjos com os ares de saudosismo nunca vivido que só os anos dois mil têm. Aparentemente banais, a enxurrada de bandas de eletropop que surgiram podem soar datadas, mas o Haim definitivamente não é uma delas.
O pop do Haim não é lugar comum, talvez por isso seja menos palatável que outros artistas do gênero e cause estranheza a uma primeira audição. As irmãs foram criadas por pais musicistas ouvindo clássicos do rock dos anos setenta e oitenta, tudo com um verniz da música feita nos anos dois mil e uma assinatura própria. As melodias bem construídas, letras simples, porém cantadas com uma verdade capaz de cativar até os ouvintes mais exigentes.
Composto por Este Haim (nascida em 1986), Danielle Haim (1989) e Alana Haim (1991), o trio californiano é dos mais experientes da música pop atual, embora tenham lançado apenas, até agora, um EP e um álbum de estreia. Danielle e Este fizeram parte do conjunto pop The Valli Girls, banda voltada para o público adolescente cujo único lançamento de destaque foi o single “Always There In You” na trilha sonora do filme Quatro Amigas e um Jeans Viajante (2005). Com o fim do grupo, as duas irmãs se juntaram à caçula, Alana, para shows ocasionais, até Julian Casablancas (ex-vocalista do Strokes) insistir que as meninas deveriam entrar no estúdio para gravar algo. Sábio Julian!
Sem receita pronta, “Days are Gone” é um álbum fluído, que apresenta duas facetas diferentes, os singles mais acessíveis (apanhado de trabalhos das irmãs que já fora lançado previamente no EP), a excelente “Falling“; o primeiro single do trio, “Forever“; “Better Off” com seus jogo vocal e percussões e “Go Slow” com uma pegada mais dubstep. A segunda parte do discos, composta para o debut perde o clima festivo e “de bem com a vida” como mantra matinal (ao menos eu o faço assim) e dançante dá vazão à melancolia, tristeza e canções mais soturnas como “Don’t Save Me“, “Let Me Go“, “Running If You Call My Name” e “My Song 5“, com seus wobbles de frequência graves pode soa algo parecido com um hip-hop a la “Yezzus” de Kanye West, talvez sejam menos acessíveis e embora possam lembrar algo que alguns grupos de indie pop já tentaram, o Haim sobressai.
As sete faixas inéditas de “Days Are Gone” ao mesmo tempo reverberam a identidade muito bem desenvolvida do Haim e encapsulam novas e bem-sucedidas referências, a primeira delas, “If I Could Change Your Mind”, é um R&B desses gostosos de se ouvir, que virou single lançado no início de 2014 e a meio country, meio trilha de filme de sessão da tarde, “The Wire“. Outra das minhas favoritas, é “Honey & I“, a faixa despluga as irmãs e as mostra em uma versão acústica que me lembrou Leslie Feist.
Os dias passados, a que o disco remete, definitivamente levaram todos os que viveram as décadas passadas e os saudosistas de dias nunca vividos à pista de dança. As irmãs mostram vigor, confiança, personalidade em seu primeiro disco, flertando com o passado, mas com os pés calcados no presente! Para conferir a presença de palco da banda deixo o vídeo abaixo da apresentação da banda no Itunes Festival de 2013.
Uma míope quase sempre muito atrasada, cinéfila por opção, musicista fracassada e cronista das pequenas idiotices da vida. Pra sustentar suas divagações é jornalista, roteirista e fotógrafa.