Engenheiro dos Beatles conta sua fantástica juventude trabalhando com o grupo em um grande livro

“Geoff Emerick terminou o Ensino Médio em Londres, aos 15 anos, para trabalhar como engenheiro assistente da Abbey Road. Após quatro anos, ele foi promovido para trabalhar como engenheiro de som de uma das mais importantes bandas ingleses, os Beatles. Em relatos fantásticos e detalhistas, ele cria um livro falando sobre essas experiências, no qual deixa o público imerso dentro da obra

Produtor George Martin e o engenheiro de som Geoff Emerick em 1995
Produtor George Martin e o engenheiro de som Geoff Emerick em 1995

Em 2006, o engenheiro de som dos Beatles, Geoff Emerick (em parceria com o jornalista Howard Massey), contou em quase 500 páginas como foi ter participado das gravações dos discos ‘Revolver’, ‘Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band’ e ‘Abbey Road’. O livro “Here, There and Everywhere – Minha Vida Gravando os Beatles” faz com que os fãs do quarteto Liverpool tenham inveja deste cara (que na época tinha 19 anos), uma vez que ele realmente conviveu com John, Paul, George e Ringo. A única parte ruim do livro é a ausência de fotografias, as imagens ilustrativas foram coletadas via internet.

“Trabalhar com os Beatles era diferente de trabalhar com os outros artistas. Com eles, toda e qualquer coisa era possível”, diz um dos trechos do livro, que possui 17 capítulos. Os primeiros falam da juventude de Geoff e sua relação com a música nos porões da casa da avó, como conseguiu o emprego nos estúdios Abbey Road aos 15 anos, a primeira vez que conheceu a banda, a Beetlemania, até finalmente chegarem as primeiras sessões do disco ‘Revolver’, que foi o primeiro em que ele trabalhou como engenheiro de som da banda, substituindo Norman Smith.

Geoff recebendo o Grammy das mãos de Ringo Starr
Geoff recebendo o Grammy das mãos de Ringo Starr

No capítulo destinado ao ‘Revolver’, o engenheiro de som admitiu que estava nervoso por ter 19 anos na época e já estar trabalhando com uma banda no topo do sucesso, mas o desafio foi estimulante. A vontade dos Beatles de querer mudar o som e o amor de Geoff por novas tecnologias ajudaram a fazer diversos experimentos musicais, o que culminou no começo da era psicodélica dos ingleses.

“Olhando em retrospectiva, acho que uma das razões pela qual eu consegui chegar a tantos sons inovadores em Revolver foi a enorme quantidade de tempo que George Martin gastou no estúdio trabalhando em complexas harmonias vocais com John, Paul e George Harrison. Era um processo longo, mas os resultados eram esperados”. George Martin era o produtor do grupo e conhecido como ‘quinto Beatle’.

Os relatos das gravações de Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band foram divididos em dois capítulos. As sessões de gravação de Pepper foram marcadas pela dificuldade de que o Martin teve para convencer uma orquestra de músicos, com décadas de experiência, a tocar do jeito que os Beatles queriam. A ausência de um deadline permitiu que trabalhasse com o álbum por cinco longos meses.  O engenheiro ganhou um Grammy, que recebeu de Ringo Starr.

Geoff, em uma das partes da obra, falou o motivo de ter desistido de participar do Álbum Branco, cujas sessões foram lembradas pelas calorosas discussões de John e Paul, pelo vício em heroína de Lennon (que o deixava agressivo), a presença constante e inconveniente de Yoko Ono, e os problemas pessoais entre os integrantes, após uma estressante viagem à Índia. Emerick relatou que este foi o primeiro sinal do fim da Beetlemania e rejeitou o título de Yoko como culpada pelo desmembramento do grupo. O engenheiro de som explicou que o excesso de convivência fez com que a relação ficasse desgastada.

Geoff e Ringo brincando com o Grammy que receberam por 'Sgt. Pepper's'
Geoff e Ringo brincando com o Grammy que receberam por ‘Sgt. Pepper’s’

O livro é recheado de curiosidades, como a confirmação da existência de uma “mensagem subliminar” na canção ‘Hey Jude’. Durante a gravação da música dedicada ao filho de Lennon que estava sofrendo com a separação dos pais,  Paul McCartney disse “Fucking Hell” quando errou uma nota e isto pode ser escutado aos dois minutos e 58 segundos. Emerick contou que a ideia de deixar o “erro” escondido na edição final foi do John Lennon.

Uma outra curiosidade é o surgimento da famosa capa do disco ‘Abbey Road’, aquela cuja capa tem os quatro membros andando numa faixa de pedestre. O nome era para ser ‘Everest’, em homenagem à marca de cigarros que Emerick fumava, e a intenção era viajar ao Tibete e tirar foto no Monte Everest. Entretanto, Ringo sugeriu: “Vamos lá para fora e chamamos o disco de Abbey Road?”.

Foi assim que surgiu o disco com uma das capas mais lembradas do mundo, que inspira vários turistas quando passam perto do estúdio a imitar a famosa pose.  Geoff negou que os Beatles amavam a Abbey Road (pelo contrário, eles estavam odiando ficar lá, uma vez que passaram boa parte de suas vidas enfurnados no estúdio), eles só tiraram esta foto porque não tinham opção. As ruas foram interditadas para que fossem feitas as fotografias. Este foi o álbum que lhe fez ganhar o segundo Grammy.

Em todos os capítulos sobre as sessões, o engenheiro de som comentou a gravação de música por música. Além disso, ele explicou, de forma bastante técnica, o processo de criação, quanto tempo demorou para deixar uma canção pronta, e as dificuldade de fazer a mixagem. É um excelente ensinamento para quem gosta de trabalhar com música (produtor ou engenheiro de som).

Capa brasileira de "Here, There and Everywhere - Minha Gravando os Beatles"
Capa brasileira de “Here, There and Everywhere – Minha Gravando os Beatles”

Após a gravação do Abbey, ele foi trabalhar na gravadora Apple, que pertencia aos Beatles, na qual ficou responsável pelo estúdio que na teoria era para funcionar como uma “fábrica” de produzir novos artistas nas terras inglesas. Após quatros anos, a instabilidade do grupo e, posteriormente, a separação deles , ele resolveu trabalhar para AIR de George Martin.

O autor não mediu as palavras para falar sobre o quarteto e de qual deles ele mais gostou de trabalhar.  Geoff Emerick foi bastante sincero em dizer que não se dava bem com o George Harrison, o considerava arrogante e que inicialmente era um guitarrista e compositor medíocre, contudo veio a melhorar ao longo do tempo. Achava John Lennon ora gentil ora grosso. Às vezes era inseguro e odiava ouvir sua voz, mesmo sendo um dos maiores cantores e compositores de rock. Além disso, Geoff comentou que Lennon falava as coisas em forma metafórica. “John sempre tinha muitas ideias sobre como ele queria que suas músicas soassem; ele sabia o que queria ouvir. O problema é que, ao contrário de Paul, ele tinha grande dificuldade em expressar”.

Quem gostar de Paul McCartney vai gostar bastante dos relatos de Geoff, pois o engenheiro de som rasgou milhares elogios para o baixista de quem depois ficou amigo e com quem realizou trabalhos após o fim dos Beatles (ás vezes, os excessos de elogios ao McCartney podem irritar o leitor). Tem uma parte do livro dedicada à sua vida pós-Beatles e como foi reencontrar Paul novamente e participar de uma gravação de um disco dele.

Geoff Emerick nasceu no subúrbio de Londres e começou a gostar de música desde a infância e na adolescência teve os primeiros contatos com o rock. Após terminar o Ensino Médio, aos 15 anos, mandou currículos para todas as gravadoras até conseguir uma entrevista de emprego com a EMI, mais precisamente na Abbey Road. Inicialmente trabalhava como engenheiro assistente.

Famosa foto do 'Abbey Road' somente aconteceu após ter desistido de uma viagem ao Monte Everest
Famosa foto do ‘Abbey Road’ somente aconteceu após ter desistido de uma viagem ao Monte Everest

A tradução chegou às terras tupiniquins somente no final do ano passado, pela editora Novo Século. O prefácio do livro é assinado por Elvis Costello, um dos cantores com quem Emerick trabalhou após os Beatles. O título do livro é devido a uma música da banda de que o engenheiro de som gosta e que demorou três dias para ser feita. É uma ótima opção para amantes da música, quem quer trabalhar com gravadoras de discos e, principalmente, para os fãs do quarteto. “Embora fosse desgastante, tanto mentalmente quanto fisicamente, aquela era uma boa maneira de trabalhar”, disse Geoff Emerick.

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Lara Paiva
Natalense, jornalista, gosta de música, livros e boas histórias desde que se entende por gente. Também tem uma quedinha pela fotografia.
Lara Paiva

Lara Paiva

Natalense, jornalista, gosta de música, livros e boas histórias desde que se entende por gente. Também tem uma quedinha pela fotografia.

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