Quando lançou um filme inspirado num de seus brinquedos temáticos, a Disney não imaginava que Piratas do Caribe viraria uma franquia tão lucrativa. Mesmo com as produções seguintes perdendo a qualidade inicial, a trupe de Jack Sparrow (Johnny Depp) continuou a ganhar dinheiro e fãs pelo mundo. Seis anos após o apático Navegando em Águas Misteriosas (Pirates of the Caribbean – On Stranger Tides), um novo capítulo chega aos cinemas para fechar o que foi iniciado lá em 2003 e, porque não, abrir caminho a outras navegações.
Piratas do Caribe – A Vingança de Salazar (Pirates of the Caribbean – Dead Men Tell No Tales, 2017) dispõe de três arcos narrativos: Henry Turner (Brenton Thwaites) busca incansavelmente uma maneira de quebrar a maldição do pai, Will (Orlando Bloom); Carina Smyth (Kaya Scodelario) luta pela vida por ser considerada uma feiticeira; e Sparrow foge da ameaça que intitula a aventura. Para sobreviver, o trio precisa achar o tridente de Poseidon, artefato mitológico nunca antes visto.
Escrito por Jeff Nathanson a partir de uma história dele e de Terry Rossio, o roteiro é, sem dúvidas, o ponto fraco da produção. A divisão de arcos tenta dar autonomia aos protagonistas, mas acaba se perdendo no péssimo desenvolvimento. A estrutura truncada chega até a ser confusa em alguns momentos, efeito que só não interfere por se tratar de um enredo vazio que não encontra motivos, mas pretextos para as inúmeras sequências de ação.
O trabalho de Nathanson é extremamente preguiçoso, resolvendo conflitos por meio de conveniências, como no primeiro encontro do trio que, curiosamente, está na mesma cidade e no mesmo momento por motivos distintos, ou num Plot Twist revelando uma importante informação do passado de um dos personagens em prol de um drama tolo e piegas.
Abraçando a postura de fazer dinheiro, o roteiro volta a demonstrar preguiça ao reciclar elementos dos capítulos anteriores. No núcleo de Salazar (Javier Bardem), o navio “abre suas entranhas” para “devorar” outras embarcações, lembrando o Kraken de O Baú da Morte (Pirates of the Caribbean – Dead Man’s Chest, 2006); a tripulação fantasma remete à de Barbosa (Geoffrey Rush) em A Maldição do Pérola Negra (Pirates of the Caribbean – The Curse of the Black Pearl, 2003), que andavam no fundo do mar enquanto neste andam sobre a água; e, tal qual Davy Jones (Bill Nighy), El Matador del Mar não pode pisar em terra firme.
Já do lado dos protagonistas, a tentativa de Henry em quebrar a maldição de seu pai é uma repetição do arco do próprio Will em O Baú da Morte; a personalidade e a postura de Carina são semelhantes as de Elizabeth Swann (Keira Knightley); por fim, voltamos a ser guiados por um trio composto por dois homens e uma mulher, tal qual nos primórdios da franquia, numa autorreferência nostálgica, mas desnecessária.
Se existe algo positivo no Script é a escolha por amarrar algumas pontas surgidas durante a cinessérie. Trazendo personagens do passado e partindo de alguns temas conhecidos, A Vingança de Salazar consegue finalizar a trama sem encerrar a série cinematográfica. Assim, em possíveis novas continuações, a Disney tem a possibilidade de criar histórias completamente novas ou até iniciar um produto derivado do original.
E se o roteiro apresenta uma porção de problemas, o mesmo não pode ser dito da parte técnica. A direção dos noruegueses Joachim Rønning e Espen Sandberg, que exagera nas cenas de ação e deixa o segundo ato um tanto cansativo, entrega criativas sequências de tirar o fôlego (destaque para o roubo do cofre e a guilhotina!). A mistura entre efeitos especiais práticos e virtuais é brilhante em quase toda a produção, escorregando poucas vezes ao trazer algo mais artificial ou evidenciar o uso do chroma key. A fotografia de Paul Cameron mantém o belíssimo visual dos capítulos anteriores, repleto de cores agradáveis. Porém, as cenas mais escuras trazem tons mais sombrios.
No elenco, a liderança de Depp já não é tão forte. Com evidentes sinais de desgastes, o astro deixa claro não estar mais à vontade num de seus papeis mais celebrados. Desinteressado e um tanto apático, o ator se entrega à extravagancia numa caricatura dele mesmo, rendendo poucos momentos genuinamente divertidos. Thwaites e Scodelario não trazem tanta química, mas funcionam bem em tela. Apesar da excelente primeira impressão, Javier Bardem pouco tem a fazer com o desinteressante Salazar, que só não é completamente descartável pelos talento e carisma do espanhol. Quem, mais uma vez, se destaca é o veterano Geoffrey Rush, com pleno domínio do Capitão Barbosa.
Piratas do Caribe – A Vingança de Salazar retoma a franquia no intuito de angariar lucros, tem problemas estruturais e se prende bastante ao passado. Mantendo a fórmula de sucesso, não inova e nem vitaliza a marca. Ainda assim, a excelência técnica e o agradável tom de aventura transformam o filme num entretenimento divertido que ainda consegue agradar.
Radialista por formação e jornalista em formação. Minha paixão pelo cinema me trouxe ao Chaplin; minha loucura, ao Movietrolla. Qualquer coisa, a culpa é d’O Chaplin… E “A Origem” é o maior filme de todos!