Lançado em 1986 e dirigido por Alex Cox, o filme decepcionará quem busca entender detalhadamente a história da banda da qual o baixista Sid Vicious fez parte, a inglesa Sex Pistols. A trajetória da banda de punk é relatada de forma vaga e até mesmo confusa, focando mais nas crises e seu consequente fim. Essas características, no entanto, não chegam a ser uma falha, afinal, o filme não é sobre os Sex Pistols, mas sim sobre uma das mais famosas e perturbadoras histórias de amor: a de Sid Vicious e Nancy Spungen.
Ele era um jovem rapaz das quebradas londrinas, tomado pelo meio em que vivia, o underground, e afogado até o último fio de cabelo na onda punk que tomou conta da Inglaterra nos anos 70 (ainda que sua paixão fosse apenas pelo ritmo musical, não pela ideologia). Ela veio do interior, mas fugiu para Londres aos 17 anos, tornando-se viciada em heroína e uma groupie, uma adolescente capaz de qualquer coisa para agradar e se relacionar com seus ídolos. Nancy era hiperativa e agressiva. Sid era orgulhoso e sempre o centro das atenções. Nancy apresentou Sid à heroína. Eles se amavam. Nancy foi uma das causas do fim dos Sex Pistols. Eles se amavam. De acordo com o filme, Sid matou Nancy com uma faca, mas depois Nancy matou Sid com uma overdose de heroína. Eles se amavam.
Quem interpreta o baixista é Gary Oldman, que faz um ótimo trabalho, se relevarmos o aspecto teatral e caricato ainda adotado pelo ator, característica comum no cinema americano de algumas décadas atrás. O ator mostra um Sid orgulhoso e arrogante, que se contorce, berra, cospe e sabe o quanto é adorado no palco dos Sex Pistols com seu baixo, mas também mostra seu lado inocente, apaixonado, doente e frágil quando está com Nancy e quando vai sendo derrotado pelo vício. Chloe Webb dá vida a Nancy com uma voz extremamente irritante, mas perfeitamente compatível com a personagem, mostrando seu lado inquieto, explosivo e ansioso sem medo, sendo capaz de transmitir a vivacidade doentia da groupie em vários momentos do filme, além de abordar de forma séria e interessante a visível influência que a moça exercia sobre Sid.
O filme se preocupa em mostrar locais e comportamentos clássicos da cena punk na Inglaterra setentista, sendo recheado de momentos marcantes. Em uma delas, Sid e Nancy estão num estúdio de gravação e, sentada em uma enorme caixa, Nancy pede que Sid lhe beije os dedos do pé; espantosamente, ele se despe de todo o seu orgulho, lentamente cai de joelhos, tira a bota preta de Nancy, rasgando sua meia arrastão e, recolhendo o pé da groupie com as mãos, como quem recebe a hóstia numa missa, ele delicadamente beija o pé da mulher que ama. É uma cena chocante, poderosa e comovente.
Em outro momento, o casal está sentado na cama de um quarto de segunda mão num hotel, estáticos diante da televisão, profundamente deprimidos e afundados em heroína. Sid deixa cair seu cigarro em Nancy, a ponta incandescente queimando-a. Irritada, ela joga o cigarro em um lugar qualquer, mas que cai numa pilha de roupas sujas e garrafas vazias, criando um fogo que gradualmente toma conta do quarto, mas nem ela nem Sid se movem para apagá-lo. Ela fica observando as chamas, entorpecidos e talvez conformados com a morte, sobrevivendo apenas porque um grupo de bombeiros aparece e apaga o fogo.
“Sid e Nancy – O amor mata” se destaca não só por mostrar o lado pessoal de uma estrela de rock, mas também a maneira de viver e de pensar de algumas pessoas que abraçaram um movimento responsável por marcar a história da Inglaterra e de vários outros países, que foi o punk. Não é indispensável, pois nem todos os punks viviam da forma que foi mostrada no filme, mas vale a pena assistir por curiosidade.
Estudante de Enfermagem que se mete em letras, músicas e desenhos. Segue a filosofia de que a vida é muito curta para gastá-la com preocupações. Dificilmente algo conseguirá surpreendê-la. Lê tudo, assiste tudo, vê o lado bom de tudo. É editora deste site.