O Homem Vitruviano é uma das obras mais famosas do espetacular Leonardo Da Vinci. O desenho tem uma função estética importante para a arte, já que trata da proporção humana com precisão matemática. Porém, o que ele não consegue precisar é o que transcende a anatomia e alcança o mais íntimo de cada um.
Vitruviano e o Poema da Inerente Invisibilidade é um curta-metragem de seis minutos repleto de sensibilidade que dialoga com a inquietude humana. A breve história acompanha uma pessoa insatisfeita com sua natureza inadequada, um conflito incômodo de alguém que não consegue ser quem verdadeiramente é. Desta forma, o tema ser traduzido numa mulher presa no corpo de um homem não poderia ser mais adequado.
Ao mesmo tempo que fala sobre sexualidade, temática extremamente atual e em constante evolução na sociedade, o filme não se resume a esta pauta, tratando também dela. Afinal, são inquietudes como esta que nos motivam a mudar, seja para buscar mais conhecimento, produzir manifestações artísticas, aplicar um dom reprimido ou, simplesmente, para buscar a própria felicidade.
O roteiro se pauta num belo poema que sabe jogar com as palavras, criando contrastes entre o que é, o que se deseja e o que aparenta ser. Tamanha subjetividade encontra eco nas imagens, que são carregadas de significado. A cena do barbear usa o sangue para mostrar a dolorosa transformação pessoal e as feridas desse processo, mas também remete ao mais íntimo da personagem, já que poucas coisas são tão particulares como o nosso sangue – a cena, aliás, parece homenagear The Big Shave, curta de Martin Scorsese, já que dialogam conceitualmente, embora tenham temáticas distintas.
Também merece destaque a montagem próxima ao fim, que traz uma ligeira perturbação para, em seguida, entregar a plenitude – não por acaso apoiada numa bela versão de Ave Maria.
Apesar da brevíssima duração, Vitruviano e o Poema da Inerente Invisibilidade traz uma mensagem completa em sentido, estética e estrutura. E se o desenho de Da Vinci traz um homem “preso” em duas formas geométricas, aqui vemos um indivíduo lutar para se livrar de si mesmo, fugindo da prisões que são o próprio corpo e as aparências palatáveis de uma sociedade antiquada.
Radialista por formação e jornalista em formação. Minha paixão pelo cinema me trouxe ao Chaplin; minha loucura, ao Movietrolla. Qualquer coisa, a culpa é d’O Chaplin… E “A Origem” é o maior filme de todos!