Entre as décadas de 40 a 80, rachaduras rompiam o tecido social e o mundo estava fora das ordens estabelecidas. O atual modelo esquematizado e restrito do jornalismo não continha as ferramentas necessárias para descrever as variadas mudanças culturais e sociais que aconteciam: guerras, ditaduras, contracultura, rock, drogas.
Como um repórter tradicional, restrito a métodos clássicos, poderia dar vazão à voz sobre tantas mudanças? Nenhum lead poderia abranger tal efervescência. Para trazer esses novos fatos à luz da população, os jornalistas resolvem voltar a sua essência: a de escritor. O jornalismo literário nasce dessa preocupação em relatar tais fatos, sustentando-se em métodos de gêneros literários para descrever a pungência e a ferocidade que se acometia na época.
Disposto a desenvolver intimamente a ferocidade da realidade, Eduardo Galeano, jornalista e escritor uruguaio, escreve sobre uma América Latina que sempre foi escravizada, numa proza mista entre literatura e política. Ele iniciou sua carreira jornalística no início da década de 1960 como editor do Marcha, influente jornal semanal que tinha como contribuidores Mario Vargas Llosa e Mario Benedetti. Em 27 de junho de 73, após o Golpe de Estado do Uruguai, o escritor é preso e forçado a deixar o país.
Seu livro, As Veias Abertas da América Latina, lançado dois anos antes, é proibido pela ditadura por se tratar de um material que poderia corromper os ideais ali cultivados; hoje é a sua obra mais reconhecida, trabalhando num jogo histórico e temporal as barbáries da colonização europeia até a atual influência política e econômica que os Estados Unidos nos impõem. Mas em 85, ao voltar do exílio, decide juntamente com Mário Benedetti, Hugo Alfaro e outros amigos jornalistas e escritores fundar o semanário Brecha. Um local de escapatória para o seu jornalismo carregado de lembranças.
(Curiosidade: Em abril de 2009, o presidente venezuelano Hugo Chávez deu um exemplar de “As Veias Abertas da América Latina” para o presidente Barack Obama durante a Quinta Cúpula das Américas. Provocador, não?)
Vale a pena também dar uma olhada na entrevista do escritor concedida ao programa Sangue Latino, do Canal Brasil.
Outra obra que também ganhou grande repercussão é O Livro dos Abraços, de 1991. Além de ser uma obra sólida, ela trás a figura do repórter que sempre permanecerá vivo em Galeano, sempre perseguindo a injustiça, conjurando personagens e histórias que ao longo do tempo foram negligenciadas, mas que precisam ser contadas e revividas.
A literatura de Galeano se tornou tão importante no presente com a sua forma madura de narrar, que suas obras viraram temas de debates sociopolíticos pelo mundo. Em maio de 2013, o escritor foi um dos convidados de honra para o Festival Internacional de Literatura de Nova York, um dos mais importantes do mundo. Ele iniciou o debate dizendo: “Nós somos feitos de histórias”. Pois contá-las, para ele, atinge indivíduos; lembrá-las, ao mesmo tempo em que cria uma consciência social, também eterniza. Contar histórias muda a História.
E a novidade da vez é a II Bienal Brasil do Livro e da Leitura, que acontecerá na capital federal, prometendo “literatura, política e muita polêmica” em seus encontros. Marcada para os dias 12 a 21 de abril, o homenageado internacional dessa edição será Eduardo Galeano, cuja presença já foi confirmada pela organização do evento. Serão 10 dias dedicados a seminários, debates, palestras, lançamentos e mostras de cinema. Além de Galeano, a lista de convidados cobre vários continentes.
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E aí, #partiu Brasília?
Estudante de jornalismo, com um tombo por cinema e literatura. Curte um festival de música assim como um bom gole de café. Enquanto não acha seu meu rumo, continua achando que é a pedra no meio do caminho.