As cores e a teatralidade de Wes Anderson em “O Grande Hotel Budapeste”

Um cartaz de filme que estampa dezesseis atores (ao menos metade deles com certo peso na indústria cinematográfica) acompanhados de arte, tipografia e figurino que remetem às cartas de um jogo de Detetive, certamente chama atenção em meio à grande quantidade de incompetência criativa que costuma inundar os corredores dos cinemas comerciais. O cartaz do filme em questão, O Grande Hotel Budapeste, por si só, me prendeu por alguns minutos, ainda no primeiro semestre deste ano. A assinatura de Wes Anderson como diretor apenas atiçou a minha ansiedade e espera por um filme que não teve força suficiente para escalar até as salas de cinemas potiguares. Decepção geral para cinéfilos e fãs do diretor que há dois anos fizera sucesso com o belíssimo Moonrise Kingdom (2012), que fez sucesso nos principais festivais e premiações de cinema no decorrer daquele ano. Contudo, não conformada com a incompetência das redes locais, dei meu jeito e consegui, recentemente, ter acesso a uma cópia do esperado novo filme de Anderson.

“O Grande Hotel Budapeste” é baseado no livro homônimo do escritor austríaco falecido Stefan Zweig e traz um roteiro que mais parece uma mistura de um romance de Agatha Christie e uma partida de Detetive, com personagens aparentemente inocentes e inofensivos que no decorrer da trama vão-se mostrando detentores de habilidades (para o bem ou para o mal) as mais diversas. Os dois protagonistas, M. Gustave (Ralph Fiennes) e o lobby boy Zero (Tony Revolori), percorrem diferentes cenários e convívios na empreitada para preservar o presente recebido em herança pelo concierge M. Gustave.

Cartaz de "O Grande Hotel Budapeste"
Cartaz de “O Grande Hotel Budapeste”

Alguns ingredientes são recorrentes nas receitas de Wes Anderson, cultuado por sua sensibilidade e competência estética. Um deles, podemos dizer, é seguramente a peculiaridade de sua fotografia e o uso inteligente das cores. A fotografia mostra sempre o melhor em cena, destaca a linda direção de arte e as incríveis paisagens escolhidas para as gravações, bem como os efeitos visuais dos quais o diretor por vezes faz uso. As cores, que parecem sempre acompanhadas por um filtro pastel que dá um tom de requinte à produção, corroboram para a eficiência da fotografia já citada e ajudam, com destreza, a contar a história. Arrisco-me a dizer, inclusive, que essas características, em O Grande Hotel Budapeste, chamam mais atenção que o roteiro em si, este por vezes quase infantil e pouco cativante.

Um dos pontos altos do filme é certamente o elenco. Para citar alguns nomes, encontramos escalados os experientes Ralph Fiennes, Edward Norton, Willem Dafoe, Jude Law e Tilda Swinton, além do jovem talento importado da frança Léa Seydoux. Contudo, alguns desses nomes aparecem pouquíssimo utilizados, o que configura um grande desperdício, e deixa o espectador que foi atraído pelo cartaz publicitário com um gosto de quero mais após as rápidas aparições de alguns nomes. A exemplo, cito Léa Seydoux, que proclama no máximo três frases em todo o filme e não chega a aparecer por mais de três minutos.

Ainda sobre as atuações, uma das características que mais gosto de Wes Anderson, presente em O Fantástico Sr. Raposo (2009) e repetida em O Grande Hotel Budapeste, é a teatralidade que confere aos seus personagens. Não existe um realismo (ou a tentativa dele) no que concerne às interpretações. Todos os atores parecem sempre adotar uma postura performática com toques de exagero para cada personagem, o que me agrada bastante enquanto espectadora, mas pode aborrecer aqueles que buscam maior veracidade na experiência cinematográfica. A obra, no entanto, não fica prejudicada, pois todos trabalham sincronizados, seguindo um mesmo padrão, não há um outro que destoa no quadro.

As cores de "O Grande Hotel Budapeste"
As cores de “O Grande Hotel Budapeste”

Confesso que esperava mais do que recebi de O Grande Hotel Budapeste. Trata-se de fato de um belo filme, com diálogos e técnica que fazem jus ao seu criador, mas talvez o excesso de personagens pouco desenvolvidos e de fatos mal explicados me impediu de sentir-me cativada pelo novo filme de Wes Anderson, que, assim como Moonrise Kingdom, já começa a mostrar-se forte concorrente para as premiações da temporada.

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Andressa Vieira
Jornalista, cinéfila incurável e escritora em formação. Típica escorpiana. Cearense natural e potiguar adotada. Apaixonada por cinema, literatura, música, arte e pessoas. Especialista em Cinema e mestranda em Estudos da Mídia (PPgEM/UFRN). É diretora deste site.
Andressa Vieira

Andressa Vieira

Jornalista, cinéfila incurável e escritora em formação. Típica escorpiana. Cearense natural e potiguar adotada. Apaixonada por cinema, literatura, música, arte e pessoas. Especialista em Cinema e mestranda em Estudos da Mídia (PPgEM/UFRN). É diretora deste site.

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