Dalton/Hebe é uma deliciosa e despretensiosa comédia potiguar

[dropcap size=small]L[/dropcap]ogo após o término da primeira temporada de Septo, o audiovisual potiguar ganhou uma segunda websérie. Com proposta completamente diferente, Dalton/Hebe arrisca menos ao apostar num formato de maior aceitação do público, a comédia de situações (sitcom), ao passo que demonstra coragem louvável ao fazer humor. É aí que ela se surge como uma deliciosa surpresa.

Simplista, a trama acompanha Dalton (Mateus Cardoso), gay, e Hebe (Quitéria Kelly), heterossexual, grandes amigos que se ajudam em busca do amor. O estilo sitcom é adequado ao tipo de história contada. Sem grandes pretensões, somos apresentados a esse relacionamento dinâmico e agradável através do cotidiano. O texto acaba sendo uma das principais ferramentas da produção e acerta quando tenta fazer rir.

Escritos por Mateus Cardoso, Moniky Rodrigues e Pedro Fiuza, os roteiros trazem piadas e diálogos ágeis, sempre inseridos nas características de seus protagonistas. Mesmo com certa acidez, brincam com esteriótipos sem jamais ofender, rendendo passagens como “Qual é a viada que você conhece que usa sunga e crocs?” e “Vamos virar lésbicas? Seria meu sonho, mulher, sair shimbalaiando essa cidade inteira”. Em seu melhor momento, o texto descreve o público “homossexualvo” de Dalton na igreja evangélica, finalizando com um desabafo sobre o romantismo heterossexual. Excelente!

Mateus Cardoso e Quitéria Kelly são Dalton e Hebe, em uma clara referência à serie britânica Downton Abbey

Entretanto, o mesmo roteiro também comete alguns equívocos. Se a comicidade é conduzida com talento, os personagens não são bem desenvolvidos. As filhas de Hebe (interpretadas pelas filhas reais da atriz Quitéria Kelly), que são duas gracinhas (RÁ), são pouco utilizadas e pouco acrescentam à personalidade da mãe, que, pelo visto em tela, parece se importar mais com o amigo. Além disso, informações importantes sobre a vida da dupla principal são despejadas em diálogos expositivos. Ela é atriz e ele é mestrando, mas nada disso ganha relevância na trama. A dupla, aliás, jamais é aprofundada quando separados, como se a vida de cada um girasse em torno do outro.

Investindo em teasers, a produção brincou com “Ninfomaníaca”, de Lars Von Trier

No quesito elenco, Dalton/Hebe acerta em cheio com seus protagonistas. Mateus e Quitéria têm uma química incrível juntos e ótimo timing cômico. As performances são convincentes e carismáticas. A quantidade elevada de xingamentos e palavras de baixo calão, que normalmente parecem apelação, fazem todo sentido entre eles. Afinal, quem tem amizades longas sabe como esse comportamento é comum e que nutre afeto e carinho verdadeiros. A naturalidade dos atores é destacada no pós-crédito do primeiro episódio (ideia ótima que deveria ter continuado), na cena do telefone e na do papo sobre séries. Essas duas últimas executadas sem cortes.

Sob a responsabilidade de Moniky Rodrigues e Pedro Fiuza, a direção da série é bastante burocrática. Enquadramentos mais fechados e a câmera estática dominam a fotografia que, a exceção dos instantes iniciais do episódio final, foge até dos Planos Gerais, comuns em sitcoms na ambientação da história. Faltou mostrar Natal com mais eficiência.

Diferente de sua contemporânea Septo, que ainda precisa se compreender e descobrir que caminho priorizar, Dalton/Hebe mostra exatamente onde quer chegar. Enquanto a primeira tenta internalizar temas mais complexos, a segunda tem a total liberdade da despretensão para externar sua graça genuína e a usa como grande trunfo. Extravagante, propositalmente caricatural e desprovida de qualquer pudor, a irmã mais nova das webséries natalenses diverte justamente por não se levar tão a sério!

Assista ao primeiro episódio de Dalton/Hebe:

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João Victor Wanderley
Radialista por formação e jornalista em formação. Minha paixão pelo cinema me trouxe ao Chaplin; minha loucura, ao Movietrolla. Qualquer coisa, a culpa é d’O Chaplin… E “A Origem” é o maior filme de todos!
João Victor Wanderley

João Victor Wanderley

Radialista por formação e jornalista em formação. Minha paixão pelo cinema me trouxe ao Chaplin; minha loucura, ao Movietrolla. Qualquer coisa, a culpa é d'O Chaplin... E "A Origem" é o maior filme de todos!

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