São muitas as produções que têm a vingança como trama, seja ela principal ou secundária. Se ficarmos restritos aos últimos dez anos, ao menos três produções que foram sucesso de público e crítica nos lembram que a vingança nunca saiu de moda: as duas edições cinematográficas de Kill Bill, a novela brasileira Avenida Brasil e a série norte-americana Revenge. Essa lista deve ganhar mais um exemplo nos próximos dias. Falo do filme “Garota Exemplar”, que estreou nesta quinta-feira em todo o país. No entanto, O CHAPLIN conferiu antes, durante a pré-estreia no Festival do Rio, e conta para você as razões pelas o novo longa de David Fincher (“A Rede Social”, “Millenium”, “O Curioso caso de Benjamim Button”) está arrebatando plateias por onde chega.

No dia do aniversário de casamento de Nick (Ben Affleck) e Amy Dunne (Rosamund Pike), ela desaparece de forma suspeita. Durante o desenrolar da história, Nick paulatinamente vai sendo considerado o principal suspeito pela polícia. Para o espectador, o filme faz flashbacks, baseado no diário de Amy, ao passado do casal, rememorando como os dois se conheceram e foram felizes nos primeiros anos do matrimônio. Com a recessão econômica e a descoberta de câncer na mãe de Nick, eles se veem obrigados a se mudar para o Missouri e, com o tempo, o desinteresse do marido pelo casamento vai ficando notável.
As cenas do passado são contrapostas às do presente nas quais Nick alega inocência, mesmo com provas incontestáveis. O caso é explorado em saturação pela imprensa, levando a opinião pública americana a condenar o personagem de Ben Affleck antes mesmo de ser julgado por um juiz ou preso pela polícia. Não dá para ir além disso na sinopse sem fazer spoiler, o que não vale a pena diante de um thriller tão sensacional e cheio de acertos como é esse novo filme do David Fincher.

Os acertos de “Garota Exemplar” começam a partir do roteiro, que é uma adaptação do livro homônimo que vendeu milhares de exemplares nos Estados Unidos. Fincher convidou a própria autora do livro, Gillian Flynn, que fez uma adaptação brilhante, mensurando com precisão as particularidades da nova mídia, no caso, o cinema. Nada em “Garota Exemplar” é gratuito. Ao contrário do que dizem muitas críticas, todos os detalhes e o maior tempo de duração da “primeira parte” – considerando que o filme tem três partes ou reviravoltas – é necessário para que tudo o que vem em seguida faça completo sentido.
A montagem é fruto do trabalho de Kirk Baxter, que mescla de maneira impecável as cenas atuais, os flashbacks e outros tipos de cena. A trilha sonora, ora presente nas cenas de Amy, ora praticamente ausente nas cenas de Nick, também funciona para deixar o público com aquele pé atrás em relação ao personagem de Ben Affleck.

Ben Affleck é um cara aprazível, mas sem muita animação e expressão. Sua personalidade combina perfeitamente com a de Nick, um cara meio perdido na situação com a qual tem que lidar no filme. Sua atuação é boa, mas nada tão surpreendente como Rosamund Pike, que seduz primorosamente o espectador com a sua Amy Dunne, tanto nas cenas românticas como nas de suspense e sangue, sendo essa última a melhor cena de Pike e de todo o filme, já próximo do desfecho.
“Garota Exemplar” será, para usar uma expressão clichê, um divisor de águas na carreira dessa atriz britânica, da mesma forma que “Millenium” abriu muitas portas para Rooney Mara. Aliás, essa é uma das características dos filmes de David Fincher: fazer com que atrizes não tão conhecidas, mas com ótimas atuações, possam estar no alto escalão de atrizes do cinema americano.

É bem verdade que o diretor repete a mesma trama dos seus últimos filmes: o modus operandi de pessoas frias e racionais, assim como acontece em “Zodíaco” (2007), “A Rede Social” (2010) e “Millenium” (2011). Mas “Garota Exemplar” é um tanto diferente. Além de misturar thriller e drama conjugal, o novo trabalho de Fincher permite que o público, ofegante, consiga relaxar um pouco com críticas bem ácidas – carregadas de humor negro – sobre o casamento e a imprensa. É um filmaço, com o qual a Academia deve premiar novamente a equipe de Fincher (“A Rede Social” levou dois Oscar em 2011) e finalmente reconhecer seu excelente trabalho como diretor.
Sagitariano carioca que mora em Natal. Jornalista formado pela UFRJ e UFRN. Apaixonado por cinema, praia e viagens.
[…] a categoria de direção, David Fincher com Garota Exemplar, Wes Anderson por O Grande Hotel Budapeste e Ava Duverney por Selma. É a primeira vez que o […]