‘Inferno’ inova na linguagem cinematográfica, mas peca pela superficialidade

Ron Howard é um diretor consistente, que ao longo da sua carreira vem entregando ao público filmes bastantes sólidos. Nos livros de Dan Brown, Ron parece encontrar seu guilty pleasure. E não falo aqui da leitura dos livros, mas da transposição para a telona. Não vou também entrar aqui na discussão livro x filme, até porque mesmo a qualidade da obra original já é bem discutida. São materiais diferentes, ponto. Howard exercita sua liberdade e experimenta usando as aventuras de Robert Langdon como seu tubo de ensaio. Em Inferno, o mais novo capítulo da (até então) trilogia, ele traz inovações interessantes e deixa escapar boas oportunidades na mesma medida.

De maneira geral, temos filmes que são bons de roteiro, que apostam na história e filmes que investem mais numa linguagem cinemática em detrimento da profundidade do que é transmitido. Um mira o olhar, o outro mira a mente. Os filmes que sabem unir as duas coisas são os que atingem o nosso coração. Em Inferno a balança pesa descaradamente para o lado da linguagem cinemática, o que, na minha opinião, não é nenhum demérito.

Se o diretor Ron Howard falha em alguma coisa, não é na tentativa de tornar o material-fonte melhor, elevando-o, mas na assumida falta de tentativa de fazê-lo. Ele abre mão de tornar o filme algo melhor, mais profundo e significativo, mas em troca nos traz um filme ágil, de ritmo alucinante. Um clássico blockbuster. Ao escolher iniciar a história pelo meio, o diretor nos força a entrar na pele do protagonista; é como pegar um ônibus em movimento, tentando entender de onde ele está vindo e para onde está indo, em meio a uma baita dor de cabeça. Se Langdon não sabe o que está acontecendo, por que, obrigatoriamente, nós deveríamos?! Os flashbacks são apresentados para nós como as memórias que vão voltando para ele e as suas visões do fim do mundo ajudam a dar um tom de mistério e urgência ao que está acontecendo.

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A trama não traz uma premissa nova: o mal da humanidade é ela mesma. Clássicos como Matrix e Eu, Robô já trataram disso anteriormente, mas aqui, em vez de máquinas tentarem assumir o comando, um bilionário desenvolve um vírus mortal que matará metade da população mundial quando liberado. A humanidade é a doença e o vírus seria a cura.

Tom Hanks e Felicity Jones fazem os protagonistas muito críveis, mas o restante do elenco é sofrível, com atuações burocráticas e cheia de estereótipos. O filme é tão cheio de reviravoltas que em certo ponto você desiste de tentar adivinhar o que está se passando e apenas se entrega ao desenrolar da história. O filme traz 2 horas de diversão e entretenimento, mas fica com você, pouquíssimo tempo depois que você sai da sala de cinema, um destino previsível. Inferno é mais uma experiência, em seu sentido literal, um exercício de linguagem do que um baita filme. Ainda assim, é um bom passatempo cinematográfico.

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Victor Hugo Roque
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