O Coração das Trevas: Apocalypse de um Cineasta

A cada dia que eu passo nesse quarto fico mais fraco. E cada dia que os vietcongs passam no mato eles ficam mais fortes. Tudo que eu precisava era de uma missão, e por todos meus pecados eles me deram uma, e depois dessa eu não ia querer mais nenhuma outra.

Para fazer um filme sobre a guerra tem que se criar uma guerra. Para se fazer um filme sobre a loucura tem que se enlouquecer.Este é o fim, lindo amigo. Este é o fim, meu único amigo. Eu não enlouqueci para escrever esse texto, então já é um texto falho. Mas esse texto não é sobre a loucura. É sobre um documentário sobre um homem enlouquecendo enquanto faz um filme sobre a loucura.

Francis Ford Coppola

O homem é Francis Ford Coppola. O filme é Apocalypse Now. O documentário é Coração das Trevas: Apocalypse de Um Cineasta. Coppola estava em seu auge. Multimilionário. Cinco Oscar nas costas. Poderoso Chefão Parte I & II no currículo. O que o levou a se embrenhar na selvas das Filipinas por mais de dois anos? O que mais faltava para o Coppola fazer? Faltava ele fazer o meu filme favorito: Apocalypse Now. Segundo ele, “meu trabalho não é um filme e nem sobre o Vietnã. Meu trabalho é o Vietnã.O que ele foi… eram muitos de nós. Nós tínhamos acesso a muito dinheiro. Muito equipamento. E pouco a pouco nós enlouquecemos”.

Apocalypse Now é a versão moderna do livro de Joseph Conrad, O Coração das Trevas. A história se passava originalmente na África, mas Coppola a trouxe para o Vietnã. John Millus escreveu a primeira versão do roteiro, e ele seria dirigido por George Lucas. Mas Lucas deu para trás e Coppola assumiu a cadeira. Ele foi com sua esposa Eleanor Coppola e seus três filhos, que incluíam Sofia Coppola, com oito anos, para as Filipinas onde ocorreriam as filmagens do longa. Lá o diretor pediu que sua esposa filmasse um diário da produção, mas ela fez mais que isso, filmou conversas com o marido sem ele saber. Esse material se tornou a base para o documentário Coração das Trevas: Apocalypse de Um Cineasta.

Pouco a pouco enlouquecendo

“Você tomou ácido naquela cena da ponte?”

“Não naquela.”

“E oque você tomou?”

“Tomei outra coisa. Anfetaminas. Maconha e Álcool.”

Esse é um dos diálogos do documentário. Quem responde é o ator Sam Bottoms, que interpretou o surfista Lance. “Éramos garotos maus” completa Sam. Isso é só para se ter uma ideia da loucura que foi a produção. De ataque cardíaco do Martin Sheen a tornado que destruiu cenários. Mas o mais interessante acontecia dentro de Coppola. Pouco a pouco, ele se tornava o Col. Kurtz. Enlouquecia. Ele acreditava que estava fazendo um filme que seria um desastre completo.”Eu não vou tirar um B ou um C, vou tirar um F. Estou pensando em me matar”, disse.

Coppola e Dennis Hooper

O documentário mostra Coppola como o personagem principal: um artista em crise, um gênio em crise. Mas ele precisava estar em crise. Dentre as diversas dificuldades que enfrentou, a mais difícil foi encontrar um final para o que chamava de um desastre de 20 milhões de dólares. Coppola achava o desfecho escrito pelo Millus muito fraco, então ele voltou ao livro do Conrad para encontrar um novo final. E para complicar a busca, Marlon Brando, que estaria nele, não tinha lido o Coração das Trevas e chegou ao set de filmagem obeso e dizendo que não queria aparecer. Pra quem viu o filme, sabe como Coppola resolveu esse problema e entrou para história. “Eu tenho que filmar irracionalmente” , disse o diretor sobre as filmagens do final.

Coppola e lideres da tribo usada nas filmagens

Coppola encontrou seu final. No fim, ele estava errado sobre o filme, ele estava, na verdade, realizando uma obra de extrema audácia que entraria para a historia do cinema como um dos melhores filmes feitos.

Quem dera que outros filmes tivessem um material assim tão revelador sobre seus realizadores. Mas talvez isso faça parte do mito que é Apocalypse Now. Assim como o filme, Coração das Trevas é uma jornada adentro da alma humana através da loucura.O horror…o horror.

Marlon Brando

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Jonathan De Assis
Acredita piamente que o Pink Floyd é a maior banda de todos os tempos e que ninguém canta melhor que o Robert Plant. Tem o Scorsese como ídolo máximo e sabe que ele transformará o DiCaprio no novo DeNiro. Com Goodfellas aprendeu as duas coisas mais importantes da vida: Nunca dedure seus amigos e mantenha a boca sempre fechada.
Jonathan De Assis

Jonathan De Assis

Acredita piamente que o Pink Floyd é a maior banda de todos os tempos e que ninguém canta melhor que o Robert Plant. Tem o Scorsese como ídolo máximo e sabe que ele transformará o DiCaprio no novo DeNiro. Com Goodfellas aprendeu as duas coisas mais importantes da vida: Nunca dedure seus amigos e mantenha a boca sempre fechada.

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