Em seu pensamento crítico, Karl Popper explorava muito a ideia de que apenas em uma sociedade aberta ao diálogo e ao debate era capaz de buscar efetivamente o progresso científico e o avanço social e político. Para ele, a argumentação racional crítica é a única forma de combater a violência e a brutalidade.
Com este pensamento, Popper buscava desenvolver no leitor o senso crítico aos projetos utópicos apresentados por vários grupos econômicos e políticos que se colocavam como únicos senhores capazes de trazer à humanidade o ‘bem ideal’, a ‘sociedade perfeita’ e a ‘sociedade sem classes’, ideais que trazem consigo um quê de abstracionismo em seus conceitos.
Assim, Popper definiu que o utopismo difundido por determinados grupos econômicos e políticos aparece sob o disfarce de racionalismo, operando na sociedade com o intuito de difundir seu caráter dogmático e acrítico, trabalhando com determinadas metas e objetivos bem definidos que atendem apenas aos anseios dos pertencentes aos grupos econômicos e políticos abastardos.
Essa pequena explanação sobre o pensamento crítico apresentado por Karl Popper serve de base para a apresentação de uma das obras literárias mais emblemáticas do século XXI, História Zero, escrita pelo célebre William Gibson. Autor de livros como, Burning Chrome e Neuromancer.
História Zero traz como enredo o lado mais sombrio do marketing e os cenários conturbados do pós-11 de setembro e da crise global de 2008. A obra narra a estória do ambicioso Hubertus Bigend, que estabelece como meta controlar o fornecimento de uniformes militares nos Estados Unidos e se valer da crescente influência desse estilo no mercado mainstream.
Para tanto, ele busca aliciar o criador anônimo de uma obscura e desejada marca de roupas que virou febre entre consumidores do mundo inteiro. A ex-roqueira e jornalista Hollis Henry está praticamente falida. A contragosto, ela aceita a proposta do bilionário belga para rastrear e identificar o misterioso designer. Nessa missão, Hollis contará com a ajuda de Milgrim, um tradutor ex-viciado em drogas cuja drástica reabilitação fora bancada pelo próprio Bigend. Mas o trabalho de ambos chama a atenção de concorrentes indesejados, dando início a uma delirante perseguição que acaba envolvendo um agente do governo norte-americano, o intrépido namorado de Hollis e até mesmo o ex-baterista de sua antiga banda.
Durante a leitura percebemos que Hubertus Bigend, estabelece uma forma de utopismo, tanto que de antemão apresenta um modelo de sociedade ideal, onde o principal objetivo é implantar um projeto que visa unificar a sociedade marcada pelas diferenças entre vários os grupos sociais que, por sua vez, possuem interesses, opiniões e objetivos divergentes. A partir dessa analise reforça o pensamento de Popper, que diz que qualquer projeto unificador traz consigo consequências perigosas e nocivas aos seres humanos, pois todos aqueles que não se enquadrarem em tal projeto de sociedade perfeita serão eliminados, a fim de não prejudicar o “bem estar da maioria”.
Outro ponto que podemos destacar é a forma como o caráter acrítico e dogmático leva facilmente ao recurso da violência e a intolerância, reforçando ainda mais a teoria do pensamento crítico de Popper. Para os leitores que ainda não conhecem essa obra, indico a edição lançada pela Editora Aleph, pois traz consigo uma tradução mais fidedigna.
Fã de cinema desde de criança, estuda Arte e Mídia na Universidade Federal de Campina Grande (Paraíba). Tem como principais paixões a música, os quadrinhos e o cinema.