O Sexto Sentido ou como eu aprendi a amar a reversão de perspectiva

Um dos maiores spoilers de todos os tempo é o final de O Sexto Sentido. Se você está morando debaixo de uma pedra desde 1999 talvez você não saiba que o personagem do Bruce Willis estava morto o filme inteiro. Ah, desculpa, eu te contei? O fato é que o filme fica melhor na segunda vez que é visto (na terceira, na quarta, quanto mais você ver, melhor ele fica). Assistir ao Sexto Sentido com essa informação em mãos é como assistir a um outro filme. Torna-se um jogo, entre você e o diretor. E o M. Night Shyamalan sabe jogar esse jogo muito bem.

Está tudo lá. O diretor não te enganou. A cada cena do Bruce Willis, você vê como o diretor foi cuidadoso. E deve ser mesmo. Muitas pessoas irão ver e rever esse filme, procurando erros, mas só encontram acertos. O diretor vai deixando dicas visuais, como a cor vermelha que aparece sempre que algum espirito está por perto. E outra dica é o frio. Sempre que há algum espirito com raiva a temperatura baixa. Isso é magistralmente mostrado na cena onde aparece o espirito da mulher. Ele mostra Cole, personagem do Haley Joel Osmet, indo ao banheiro, corta para um close do termostato, mostrando a temperatura abaixando, mas o terror vai subindo, corte de volta para o plano de Cole mijando, mas só que, desta vez, um vulto passa  atrás dele, corta para um close de Cole com um calafrio. Terror imediato.

Você acha que eles estão conversando? Pense de novo

Uma personagem que muda totalmente na segunda vez que você a vê é a da esposa do Bruce, Anna Crowe, interpretada pela Olivia Williams. Primeiramente, ela é uma esposa distante, eles mal se falam, no dia do aniversario de casamento deles, na cena do restaurante ela dá um sem vida “feliz aniversario de casamento” (guarde essa cena), é uma esposa que está a ponto de trair o marido. Mas quando você vê o filme de novo , ela se torna a esposa depressiva, que não consegue esquecer o marido, vai comemorar o aniversario deles sozinha (a cena do restaurante!), toma remédios anti-depressivos, e preste atenção na cor das pilulas, são vermelhas! E na questão da “traição”, é justamente o contrario, ela não que se envolver com outra pessoa de novo, pois isso dói. Na cena final do filme ela está assistindo ao vídeo do casamento deles. “Por que você foi embora?”, ela diz.

Por falar na cena do jantar de aniversário de casamento, que é simplesmente genial, Shyamalan filma ela toda em apenas um plano.Vemos um plano aberto de um restaurante, Anna está sentada sozinha na mesma  mesa de costas para nós, e ela está usando vermelho. Bruce aparece em cena e se senta na cadeira, perceba que ele não puxa a cadeira! Ele começa a falar com ela sobre Cole, ela não responde, e a câmera vai lentamente se aproximando, quando finalmente temos ele em um plano bem próximo o garçom chega com a conta, neste momento Bruce “tenta pegar” (mas não poderia, por que só vê o que quer ver), mas Anne pega primeiro e a câmera se volta para ela. Ele continua a falar, ela dá um “olhar” pra ele, e depois diz “feliz aniversario de casamento” e sai da mesa. Veja como o diretor é feliz nessa cena, ela tem significados completamente diferentes dependendo de quantas vezes você viu o filme. É um trabalho difícil também para a atriz Olivia Williams, que tem que interpretar uma cena com significados tão distintos. E esta cena é muito interessante pois Anne é o único personagem, fora o Cole, que supostamente fala com o personagem do Bruce e também é uma cena que acontecem em público, perceba como o diretor foi corajoso e desafiador nesta cena. Há também um piada sobre esse momento no filme 12 homens e um outro segredo, onde Bruce Willis faz uma participação como ele mesmo. No filme, um funcionário do museu diz que descobriu que Bruce estava morto nesta cena, e o Willis ironicamente responde, estou parafraseando: “É claro que sabia, por isso o filme fez 700 milhões de dólares só no cinema”.

O suspense do filme se torna um drama mas, mesmo sabendo os segredos do filme, ele continua  assustador. É um dos filmes mais assustadores que eu já vi, é um terror psicológico, quiçá o melhor filme do gênero feito pois, além de um terror, ele é um forte drama, você entra no interior dos personagens e seus dramas são assustadores, tal como “O Exorcista” e “O Iluminado”.

Mas fique claro que eu não estou aqui incentivando vocês a darem spoilers (se podemos considerar nos dias de hoje o final de Sexto Sentido como um spoiler). Por isso eu disse que o filme fica melhor na segunda vez que é visto, se subentende que você passou pela experiencia mindfucking que é ver o filme pela primeira vez. Quando eu vi o filme pela primeira vez, não sabia do seu segredo. Eu vi quando era criança, à noite no SBT. Parodiando os títulos de American Pie, a primeira vez é inesquecível, a segunda é ainda melhor!

Compartilhe

Jonathan De Assis
Acredita piamente que o Pink Floyd é a maior banda de todos os tempos e que ninguém canta melhor que o Robert Plant. Tem o Scorsese como ídolo máximo e sabe que ele transformará o DiCaprio no novo DeNiro. Com Goodfellas aprendeu as duas coisas mais importantes da vida: Nunca dedure seus amigos e mantenha a boca sempre fechada.
Jonathan De Assis

Jonathan De Assis

Acredita piamente que o Pink Floyd é a maior banda de todos os tempos e que ninguém canta melhor que o Robert Plant. Tem o Scorsese como ídolo máximo e sabe que ele transformará o DiCaprio no novo DeNiro. Com Goodfellas aprendeu as duas coisas mais importantes da vida: Nunca dedure seus amigos e mantenha a boca sempre fechada.

Postagens Relacionadas

sala de cinema
Qual o futuro das redes de salas de cinema?
As salas de cinema vivenciam um limbo há praticamente um ano. À exceção de curtos espaços de tempo em...
89ab4dcc24d58e1c39f90f47df02d278b2407b12
A diferença entre crítica e teoria do cinema
Podemos dividir os estudos fílmicos em três práticas: histórica, teórica e crítica. Hoje irei me focar...

Deixe uma resposta

0 0 votes
Classificação do artigo
Subscribe
Notify of
guest
0 Comentários
Inline Feedbacks
View all comments
0
Would love your thoughts, please comment.x