“Hello Gringo! Welcome to Brazil. Não repara a bagunça. Don’t repair the mess.”
Eu meio que me pergunto sobre qual bagunça o Gregório se referia: a do país ou de sua cabeça. De qualquer forma, as duas têm uma beleza ofuscada. O país, por toda corrupção, e Gregório, pela sua singular atuação no canal Porta dos Fundos. É uma pena que a maioria das pessoas o conheça apenas pelas esquetes ou personagens e não pela sua escrita, poesia e interpretação individual do mundo.
Admito que fora um texto ou outro publicado no caderno Ilustrada, do jornal Folha de São Paulo, eu conhecia muito pouco do Gregório-escritor. Alterei essa realidade há poucos meses quando conheci o Gregório-poeta no livro “Ligue os pontos”, me apaixonei e passei a admirá-lo além do teatro. A publicação foi um salto para mim, primeiro porque não conhecia esse lado do Duvivier, segundo porque foi o primeiro livro de poesia que realmente li. Se “Ligue os pontos” foi um salto, “Put some farofa” foi se jogar de paraquedas: uma aventura estimulante, linda e encantadora.

Tudo começa com o texto mais inesquecível da Copa do Mundo 2014, certo? Errado. O titulado “Pardon anything” pode ter sigo o “chega para cá” que fez a editora Companhia das Letras despertar a curiosidade e decidir por produzir e publicar o livro, mas diferentemente do que imaginei, não faz a abertura da obra. Depois de páginas em branco, informações de praxe das publicações e sumários, o texto inicial, é um igualmente muito bom, porém de autoria dos editores.
“Uma vez, o Antonio Prata perguntou ao Gregorio: ‘Se alguém apontasse uma arma na sua cabeça e pedisse para você decidir: ator, roteirista, poeta ou cronista, o que você diria?’, ao que vem a resposta: ‘Cara, abaixa essa arma’. Desista, não insista. O Gregorio não vai se decidir. (…) Put some farinha, manteiga, ovo, cebola, se quiser couve, bacon, banana, azeitona: a farofa é como coração de mãe, nela quase tudo cabe e ela em quase tudo cabe.”
São duas páginas de dedicatória dos editores que merecem os mais singelos parabéns. Aliás, não apenas pela escrita, mas pela obra por completo. Desde o título, passando pela capa, moldes internos e textos escolhidos: tudo foi meticulosamente selecionado e planejado para ser genial. Inclusive, a contra-capa! A costumeira sinopse deu lugar a algumas palavras de Luis Fernando Veríssimo que, é claro, fez jus à sua fama.

Como uma iniciante na relação leitor-crônica, não posso dizer que é fácil me prender a esse modelo. Me interesso pelo gênero, mas em geral, nas publicações de jornais e blogs. Com exceção de um ou dois livros, posso afirmar que minha experiência com obras de cronistas é quase nula. Por isso, foi, tecnicamente, simples encontrar o que me prendeu tanto a publicação: o reconhecimento em quase tudo o que está escrito. E acredito que isso poderia acontecer com qualquer leitor ou, mais precisamente, com todos.
O Gregorio tem uma forma única de enxergar o mundo. Ele vê aquilo que, na verdade, todo mundo vê, mas não sabe que vê até que alguém o diga que está vendo. Então, além de dizer, Gregorio escreve, descreve e inscreve. Ele fala sobre amores monótonos e você percebe que já esteve nessa situação; ele fala sobre as exigências de mudanças em um relacionamento e você nota que já foi vítima de alguém ou fez alguém de vítima; ele fala da evolução de personalidade e você se pega lendo sobre si próprio.
Mas calma, nem tudo diz respeito a relacionamentos ou nós mesmos. Tem uns 20% falando sobre machismo, tradicionalismo e conservadorismo, 10% sobre religião, outros 10% sobre política e mais uns 15% à respeito de hipocrisia e ironias. Também existe um bocadinho de roteiros do Porta dos Fundos, relatos de experiências e textos aleatórios que não se encaixam numa temática específica.
Quanto aos roteiros, até eles se tornam leituras cativantes, mesmo quando já se assistiu ao respectivo vídeo. É possível notar as diferenças, a presença mais convicta da crítica e a inteligência do humor.
Talvez o título do livro seja mais que apenas um título, seja um conceito, uma teoria ou uma descrição: Gregorio é como farofa, nele quase tudo cabe e ele em quase tudo cabe. Na vida, put some farofa ou put some Gregorio. It’s delicious.
Pseudo-escritora com um pé em artes cênicas, decidiu se mediar entre dois mundos e cursar jornalismo. Apaixonada por literatura, fotografia e Canadá, quer abraçar o mundo com as pernas e mantém em um caderninho uma lista de sonhos, desejos e objetivos ainda a serem alcançados. Para dar cor a vida, escreve em blogs, fotografa espontaneidade e produz audiovisuais.