Uma Noite na Lua: monólogo traz texto criativo e Gregório Duvivier em ótima forma

Quem nunca falou só que atire a primeira pedra! Bem, eu por natureza de filha única, sempre adorei criar personagens imaginários, falar alto pelos cantos e travar diversos monólogos comigo mesma, afinal, eu sempre tinha razão em tudo! Quando crescida, sempre me encantei por monólogos, afinal, não é fácil escrever um texto para um único ator interpretar no palco, requer talento em seus diálogos que prendam o espectador, com percepção de construção de cenário e iluminação que favoreçam seu personagem. E, obviamente, a presença do ator, pra segurar o público ao longo dos vários minutos em cima do palco.

“Uma Noite na Lua”, conta com o talento de um autor criativo e inteligente, João Falcão, e de um ator que pouco a pouco vem se firmando com um dos mais atuantes e interessantes de sua geração, Gregório Duvivier.

Foto: Divulgação
Foto: Divulgação

O Teatro Alberto Maranhão (TAM), recebeu nestes sábado (01) e domingo (02) de novembro, o espetáculo, em duas sessões cada dia. Tive a oportunidade de conferir a peça neste domingo, em uma sessão às 18h com a plateia lotada, frisas e camarotes também bem preenchidos. Na entrada não recebei nenhum programa da apresentação, com sinopse da peça, fotografias e ficha técnica. Desprovida de qualquer informação anterior, entrei no TAM e só encontrei a fumaça saindo do palco, pessoas que provavelmente não estariam ali num domingo a noite, não fosse o sucesso do ator Gregório Duvivier em seu canal do YouTube (e agora também programa de TV) “Porta dos Fundos”.

Todos em seus  lugares e eis que começa o espetáculo. “Um homem sozinho no palco com uma ideia”, repete o personagem principal (e único) que não tem nome. Dele, só sabemos de suas angústias como “quase escritor”, como o mesmo diz, a saudade de sua amada que o deixou, Berenice. O palco era desprovido de qualquer elemento de cena, que não o ator com seu figurino e a luz.

Sim, a iluminação neste espetáculo exerce uma função absolutamente imprescindível, dialogando com as falas do ator e preenchendo a solidão do personagem. De forma metalinguística, o autor da peça, que é o ator em cena, trava um duelo consigo mesmo e com sua capacidade de criar um espetáculo em um curto espaço de tempo para entregar a um ator que conhecera em uma festa, no entanto, seu principal mote é reconquistar sua amada.

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A imaginação e devaneios do personagem são acompanhados pelo público, como se estivesse dentro da cabeça dele. O espetáculo é o que eu chamaria de “uma invasão permitida da privacidade de alguém em crise criativa”, buscando de alguma forma se inserir na sociedade. Os conflitos do personagem me lembraram o longa de Spike Jonze, “Adaptação”.

Gregório Duviver canta, dança, com desenvoltura prende atenção do público e apesar de sua baixa estatura, se agiganta e preenche o palco. Por vezes é possível sentir o texto escrito por Falcão ganhando vida, uma vez que a peça se trata de um processo de produção de um espetáculo teatral. As palavras são muito bem escolhidas e deveras enxutas, sem firulas, exageros e nada “neo-intelectual-reflexivo” sai da boca do personagem, mas sim falas críveis e angústias de um autor em apuros que me soaram bastante verdadeiras.

Trata-se de uma comédia com tons de tensão, divertida e extremamente criativa. Duvivier, que também dirige “Uma noite na Lua”, fez algo que eu acho louvável em monólogos, ele soube dar o tom certo ao personagem, sem deixá-lo por demais melodramático, um completo panaca, deu o tom plausível e que coube ao seu “autor perdido”. Afinal, quantos e quantos autores não tiveram a lua como sua companhia nas madrugadas insones de criação à procura de uma inspiração?

Sinto que a arte cumpre seu papel quando, ao final do espetáculo, os espectadores deixam seus assentos ainda um tanto atônitos, tocados de alguma forma por aquilo que experimentaram, pelo tempo em que se confrontaram com uma obra de arte. Ah, doce Berenice, que não saía da cabeça do personagem do espetáculo, talvez fosse a musa e a inspiração necessária para que o autor, amedrontado, um tanto atrapalhado e extremamente sensível, desenrolasse sua obra. Quanto a mim, que entrei um tanto cética no teatro, saí reconfortada e com a satisfação de que um texto de qualidade salvou meu final de semana.

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Leila de Melo
Uma míope quase sempre muito atrasada, cinéfila por opção, musicista fracassada e cronista das pequenas idiotices da vida. Pra sustentar suas divagações é jornalista, roteirista e fotógrafa.
Leila de Melo

Leila de Melo

Uma míope quase sempre muito atrasada, cinéfila por opção, musicista fracassada e cronista das pequenas idiotices da vida. Pra sustentar suas divagações é jornalista, roteirista e fotógrafa.

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9 anos atrás

[…] Depois do bate-papo, Gregório atendeu a dezenas de fãs que se revezavam entre poses pra foto, emoção ao vê-lo e pedidos de autógrafo no livro. Depois disso, foi ao TAM, onde se apresentou em duas sessões no sábado e duas no domingo, na peça ”Uma noite na lua&#… […]

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